Manifesto em defesa ao cinema estético
Calma, antes de vocês discordarem, vou fazer o possível para que este texto faça sentido.
Tudo começa, acredito eu, com o Mágico de Oz. A estrada de tijolos amarelos, os sapatos mágicos, o arco-íris e a cidade das esmeraldas. A partir daí, o cinema desmembrou-se por um caminho alternativo, um caminho colorido, excêntrico e fantasioso, cujo estilo não agradou tanta gente. Fugindo do movimento naturalista, tivemos clássicos como Mary Poppins, Alice no País das Maravilhas, As Crônicas de Nárnia, A Fantástica Fábrica de Chocolate, La La Land, e mais recentemente, em 2023, Barbie e Wonka.
Muitos dos principais argumentos para que haja esta ligeira aversão ao cinema fantasioso dizem respeito a uma possível alienação acerca dos problemas reais do mundo em que vivemos. Acusam de “desnecessário”, “perda de tempo”, isso para não trazer aqui comentários mais pesados que já li em postagens nas redes sociais. Talvez agora seja o momento de compartilhar um pensamento do filósofo Friedrich Nietzsche. Quando ele diz “A arte existe para que a realidade não nos destrua”, é bem provável que esteja se referindo à arte como prazer estético. Por qual motivo teria, então, a sociedade aceito todos os outros prazeres como essenciais à vida, exceto quando se trata de arte? Essa é uma questão que nunca irei compreender.
Durante um bom tempo, apreciadores do cinema eram vistos como intelectuais. Dentro desse rótulo, não havia espaço e prestígio para os filmes infantis ou focados no público feminino. “Você tem que ver os clássicos”, é o mantra que ecoa nas rodas de conversa. Só esquecem que clássicos são clássicos dentro de seu próprio gênero. São manifestações artísticas como quaisquer outras, tendo suas próprias intenções e subjetividades, que, aos olhos do espectador mais sensível, cruzam as fronteiras entre realidade e fantasia, drama e comédia, política e arte.
Um recurso muito debatido entre os criadores de histórias é a balança entre as emoções. Há quase sempre dois caminhos para se contar uma história: início feliz e final triste, início triste e final feliz. O meio é o recheio. É onde podemos abordar vários temas e de diversas formas. A estética e as sensações são controladas por quem está nos bastidores, mas é o espectador quem deita a cabeça no travesseiro refletindo sobre o que acaba de ver.
O tempo passa e o que fica é a memória sensitiva. São esses os filmes que assistimos incontáveis vezes, em diversos formatos, os filmes que nos fazem reviver momentos de infância, momentos da adolescência, momentos em família. Acredito que o argumento utilizado é de certa forma fraco e injusto, e na verdade, muito honestamente, o que parece ser o ponto de incômodo presente nesses exemplos é a alegria, as cores, a diversão. No fim do dia, a pergunta que fica é: será que estamos mesmo preocupados com o conteúdo dos filmes ou só nos esquecemos que o sofrimento não é indicador de resiliência, sucesso ou superação? Será que Barbie é só um filme sobre uma boneca de plástico ou só somos incapazes de apreciar a sutileza de subtextos em cenários que fogem do que aprendemos a chamar de realidade?