Crítica: Devagar – 47ª Mostra de São Paulo
Devagar
Direção: Marija Kavtaradze
Roteiro: Marija Kavtaradze
Elenco: Greta Grinevičiūtė, Kęstutis Cicėnas, Pijus Ganusauskas, Laima Akstinaite, Vaiva Zymante, Mantas Barvicius, Rimante Valiukaite.
Sinopse: Elena é uma dançarina contemporânea que conhece Dovydas quando ele é indicado para interpretar uma aula sua em linguagem de sinais para os alunos. Eles se sentem imediatamente atraídos um pelo outro e a conexão entre os dois se aprofunda. Mas quando Dovydas revela para Elena que é assexual, o casal vai precisar descobrir uma maneira de construir seus gestos de intimidade.
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É encantador como o filme lituano “Devagar”, de Marija Kavtaradze, consegue ser tão doce e sensual. O intérprete de língua de sinais Dovydas conhece Elena. Os dois dançam. Ela, porque é professora da arte do balé. Ele, por meio dos gestos que utiliza – e as cenas em que ele interpreta uma música são especialmente belas.
Os protagonistas não são surdos, mas o filme é essencialmente silencioso. Há muita música, mas há também muitos momentos de olhar, de pessoas deitadas na cama, de trilha sonora reduzida.
Apesar da conexão que os protagonistas criam logo no começo, Dovydas conta que é assexual. E se o filme consegue dar foco a uma história específica (e particularmente romântica), ele também funciona como um ótimo instrumento educativo a respeito da assexualidade. É possível entender plenamente, ao longo da projeção, como funciona a relação entre afeto e sexo para Dovydas – algo tão diferente para Elena.
É curioso notar como o rapaz está sempre comendo: ele devora sanduíches em diversos momentos. Há uma referência ao hábito de sua mãe, que sempre sugeria ir ao McDonald’s para acalmar ou solucionar um problema. O ato de comer também é uma maneira de extrapolar a libido. E o filme “Devagar” está cheio de libido.
Os corpos dançam, gesticulam, tocam com carinho e afeto. “Você só precisava de tempo para entender”, diz Dovydas a Elena sobre uma piada, mas a frase também funciona para as relações e as formas diferentes de amar: às vezes, precisamos de tempo – e por isso o título do filme.
A poesia e a delicadeza da cineasta Marija Kavtaradze só não ganham do carisma dos atores. Simpáticos e belos, Kęstutis Cicėnas e Greta Grinevičiūtė estão à vontade com seus corpos: as mãos que tocam, os braços que se erguem e os sorrisos que se abrem consolidam a sensação de conhecer alguém e mergulhar em seu mundo gradativamente. Enquanto os dois se conhecem, nós também os conhecemos.
“Devagar” tem romance, poesia, sensualidade, e ainda carrega a importante missão de dar voz e representatividade à letra A da sigla LGBTQIA+, muitas vezes esquecida e comumente preterida neste mundo centrado em um único tipo de consumação dos afetos e paixões.