Representatividade importa, mas a autocrítica é necessária!
Mulher entra em uma sala de cinema. Ela é jovem e respira com dificuldade, como quem estava correndo minutos antes. Olha ao redor e vê um homem sentado na primeira fileira, de frente para a tela. As luzes se apagam enquanto ela caminha até o lugar onde o homem está. Cuidadosamente senta ao seu lado.
Ao ler esta pequena descrição qual o tom de pele que você imaginou os personagens? Provavelmente na sua mente eles eram brancos. Dentro da nossa sociedade, quando não é descrita a cor de um personagem, a maioria das pessoas pensa automaticamente que ele seja branco. É a lógica de uma sociedade onde brancos são colocados como centro, como os dominantes. E quem não faz parte dessa lógica, é automaticamente colocado como “o outro”.
E isso se reflete no cinema. Durante muitos anos os filmes eram protagonizados por pessoas brancas na maioria dos países. E se formos pensar em Hollywood, demorou bastante para que negros, asiaticos, latinos tivessem oportunidade de representar personagens complexos e com nuances variadas.
Na verdade, se formos analisar as produções, até hoje em dia pessoas brancas são a maioria entre os protagonistas de filmes. E justamente por conta da dificuldade de protagonismo não-branco que é extremamente importante que mais obras tragam pessoas pretas, asiáticas, latinas para o centro das narrativas.
E nos últimos anos esse debate tem crescido bastante, fazendo com que o público peça por mais personagens diversos e, com isso, gerando mais histórias com protagonismo não-branco.
Vendo a inquietação de uma grande parcela do público, a Disney resolveu trazer mais inclusão para seus live-actions. É o caso de A Pequena Sereia, que reconta a história da princesa Ariel, com atores humanos. E com a Halle Bailey como protagonista do filme.
Sendo uma atriz negra, as críticas à escolha de Halle para ser a Ariel foram inúmeras. Pessoas disseram que não fazia sentido já que na animação a personagem é ruiva, outras falaram que estavam estragando suas infâncias e mais uma série de comentários.
É importante que, se uma empresa do tamanho da Disney está transformando suas animações clássicas em live-actions, que eles possuam todo tipo de protagonismo. E por mais que na animação clássica Ariel seja uma sereia branca e ruiva, nada na história faz com que exista uma prerrogativa para a etnia da personagem. Então, se vão produzir os live-actions, que eles não sejam protagonizados apenas por pessoas brancas.
Dito isso, não faz sentido acreditar que uma empresa do tamanho da Disney esteja colocando personagens não-brancos em seus filmes, exclusivamente por acreditar que o mundo precisa de mais inclusão.
A verdade é que na lógica de indústria de Hollywood, essas mudanças de protagonismo só existem porque na atualidade existe uma demanda por mais diversidade. O público pagante não é apenas branco, pelo contrário. E as pessoas cansaram de não se enxergarem na tela.
E para não verem esse público deixar de investir o próprio dinheiro nas novas produções da empresa, a Disney resolveu inserir mais protagonismo não-branco em suas obras.
A realidade é que o filme foi lançado e muitas meninas negras se sentiram incluídas nas narrativas de princesa. E a importância disso é gigante. Só que não é por isso que vamos simplesmente fechar os olhos para o fato de que ainda é preciso que as grandes empresas, como a Disney, tratem minorias sociais com mais e mais respeito. E criem obras originais que valorizem esse público. Com protagonistas com mais nuances e que fujam do olhar dominante padrão. E que abram espaço para criadores não-brancos também.
Brancos são protagonistas o tempo inteiro, com narrativas complexas e cheias de camadas. Pessoas não-brancas merecem o mesmo tratamento. Por mais que seja interessante ver uma menina negra sendo protagonista de uma história com tanto apelo como A Pequena Sereia, isso não é o suficiente. É preciso diversificar as histórias e criar mais e mais personagens não-brancos que sejam tão complexos e bem construídos como os brancos que são colocados nas telas o tempo inteiro.