Crítica: Eu Vejo Você Em Todos os Lugares - 45ª Mostra de São Paulo
Crítica: Eu Vejo Você Em Todos os Lugares - 45ª Mostra de São Paulo
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Crítica: Eu Vejo Você Em Todos os Lugares – 45ª Mostra de São Paulo

Eu Vejo Você Em Todos os Lugares – Ficha técnica:
Direção: Bence Fliegauf
Roteiro: Bence Fliegauf
Nacionalidade e Lançamento: Hungria, 2021 (45ª Mostra de São Paulo)
Sinopse: Sete pequenas narrativas, tão hipnóticas quanto imprevisíveis, e que culminam em um caleidoscópio psicológico em que casais, famílias e amigos conectam-se por meio de um destino comum. O filme é uma espécie de sequência de Forest, do diretor Bence Fliegauf.
Elenco: Juli Jakab, Lázló Cziffer, Lilla Kizlinger, Zsolt Végh, István Lénárt, Eszter Balla.

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É interessante notar como o mal-estar causado pelo húngaro Eu Vejo Você Em Todos os Lugares (Rengeteg – Mindenhol Látlak) representa uma faca de dois gumes para o próprio filme. Uma coleção de esquetes (cada cena possui começo e fim em si mesma), o filme de Benedek Fliegauf é descrito como uma espécie de sequência a seu filme de 2003 Forest, que foi escolhido como representante da Hungria para o Oscar 2004. Nas sete pequenas narrativas contidas aqui, temos cenas que se passam predominantemente em um só cômodo, majoritariamente apoiadas nos diálogos e atuações. Não temos muito contexto prévio, e toda informação expressada sobre os conflitos com os quais os personagens vivem surgem das interações em cena. Uma filha remói uma tragédia com o pai; um casal discute o relacionamento e uma possível traição; um menino ateu é proibido de sair de casa e discute com a mãe sobre religião; um assassino de aluguel recebe uma proposta; e assim por diante. Acompanhamos o ponto de ebulição das relações dos personagens que habitam essa antologia, e o filme estabelece a lógica de mostrar um fragmento do fim de cada segmento antes de voltar para o começo dele, para que saibamos como as coisas caminharam até a imagem misteriosa mostrada no começo.

Assim, se estabelece uma narrativa de ciclos, mas também de mistério. Esse mistério pode muito bem ser o fator principal para que Eu Vejo Você Em Todos os Lugares mantenha a atenção do espectador, que é colocado diante dessas situações incomuns e tenta desvendar aos poucos o que está acontecendo exatamente. É a faca de dois gumes citada no começo do texto: ao mesmo tempo em que o filme nunca falha em transmitir uma sensação mórbida de incômodo, esses começos e fins e si mesmo nos fazem questionar qual o sentido da obra, qual a proposta em si. O filme de Fliegauf se mostra ambicioso por abordar temas complexos dentro do luto, morte, sexo, teocracia, família, relacionamentos amorosos e amizade, e possui um tempo limitado para tocar nestes assuntos. As histórias podem terminar de forma tanto reflexiva como inconclusiva, o que acaba vindo também do pouco tempo para assimilar o que transcorreu. Assim, resta apenas uma sensação um tanto pessimista que paira a obra, entre seus personagens e situações niilistas.

Existe, então, essa crescente indicação que a obra está cada vez mais pendendo para o mero registro fetichista do sofrimento, um dos casos onde a proposta e a competência da execução pode implodir o projeto. O conflito e sofrimento que começa e termina em si mesmo pode se esgotar lá pelo penúltimo segmento. O que continua trazendo a atenção da audiência, entretanto, é que inegavelmente existe uma eficácia da atuação, uma eficácia que torna até mesmo o texto mais competente do que poderia ser em primeiro lugar. A câmera inquieta que tenta acompanhar os movimentos dos atores em cena frequentemente se encontra, também, próxima do caricatural, na forma insistente com que foca e desfoca em mãos.  Porém, como num teatro (e talvez essa obra funcionasse melhor como espetáculo), a força reside nas interações dos corpos – aqui vistos através de focos nos rostos e partes do corpo, como criaturas disformes – com o que se encontra ao redor.

  • Nota
3.5

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