Crítica: Mothering Sunday - 45ª Mostra de Cinema de São Paulo
Crítica: Mothering Sunday - 45ª Mostra de Cinema de São Paulo
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Crítica: Mothering Sunday – 45ª Mostra de Cinema de São Paulo

Mothering Sunday – Ficha técnica:
Direção: Eva Husson
Roteiro: Alice Birch
Nacionalidade e Lançamento: Reino Unido, 2021 (45ª Mostra de São Paulo)
Sinopse: Inglaterra, 1924. Jane Fairchild trabalha como doméstica na casa dos Niven. Ela ganha uma folga no “Dia das Mães”, enquanto o sr. e a sra. Niven participam da celebração do noivado de Paul, filho de seus vizinhos. Jane está feliz com a repentina liberdade em um lindo domingo de primavera.
Elenco: Odessa Young, Josh O’Connor, Ṣọpẹ́ Dìrísù, Olivia Colman, Colin Firth, Glenda Jackson, Patsy Ferran, Emma D’Arcy.

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Não tenho dúvidas de que o livro Mothering Sunday, de Graham Swift, seja uma leitura bastante agradável. Pelo menos é o que evoca o novo filme da cineasta francesa Eva Husson, exibido na Perspectiva Internacional da 45ª Mostra de Cinema de São Paulo. Estrelado por atores em ascensão como Josh O’Connor e Odessa Young, o filme conta com a presença de Olivia Colman e Colin Firth em papeis que não exigem muito mais do que o nome nos cartazes.

Com roteiro de Alice Birch (Succession, Normal People), o filme conta a história do romance entre Jane Fairchild, empregada da família Niven, e o jovem Paul Sheringham, herdeiro abastado da propriedade vizinha que teria a obrigação de se casar com uma mulher igualmente rica. Enquanto isso, acompanhamos a própria Fairchild, mais velha, relembrando a história enquanto escreve seu livro.

A maior parte dos acontecimentos de Mothering Sunday ocorre no domingo que o intitula – e que eu creio que se modificará bastante em um lançamento comercial no Brasil (boa sorte aos tradutores). Trata-se de um feriado cristão de homenagem às mães, comum nos países de língua inglesa. É neste dia que Jane, de folga, vai à casa dos Sheringham para ter uma tarde de amor com seu amante secreto, enquanto os membros mais velhos das famílias vizinhas se encontram em um almoço ao ar livre. Após o sexo com a jovem, Paul precisa se juntar aos pais e à namorada oficial, e então permite que Jane se demore na sofisticada mansão.

Mothering Sunday tem, de fato, ares de um domingo preguiçoso e solitário. Não tanto por ter o ritmo da vida que se tinha nos anos 1920, mas por não se permitir extrapolar a tensão e o drama construídos ao longo dos 110 minutos de duração. Há uma conexão entre a linguagem do filme e sua temática, que passa pela interrupção: como o coito interrompido que espalha sêmen pelo lençol – e que Paul afirma ser necessário para não depositar a “semente” na amante – o filme de Eva Husson perpassa as tragédias que impedem a catarse – e a vida.

Se os personagens citados (e vistos em flashbacks quando crianças) morreram na guerra, tendo suas vidas interrompidas na tenra idade, a dor da mãe é também sempre contida, e mesmo quando desata em um choro, vem reprimida e incompleta. Como o cavalo que nunca ganhou uma corrida e o segredo de Jane jamais revelado, “Mothering Sunday” é uma sucessão de barreiras e impedimentos à fluidez humana. Essa fluidez, aqui, é literal. Ela surge, de fato, em forma de fluidos: o sangue da virgindade, o sêmen descartado, as lágrimas reprimidas diante da morte de quem se ama.

“Mothering Sunday” é anticatártico porque assim é a aristocracia e suas regras. São essas normas conservadoras e o medo de “perder o que se tem” que impedem a expressão máxima das pessoas. Quando a sra. Niven diz que inveja a empregada por ser órfã e não ter “nada a perder” – em uma visão deturpada e errônea que só alguém privilegiado poderia dizer –, o que ela talvez queira exprimir é que a protagonista tem a oportunidade de encontrar sua própria libertação por poder se desvencilhar das regras.

É o que Jane encontra nas palavras.

O espectador, no entanto, não encontra nada a expurgar, restando-lhe apenas a melancolia de um coito interrompido.

  • Nota
3

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