Crítica: Mirador (24ª Mostra de Cinema de Tiradentes)
Mirador discute o lugar e a posição do homem na sociedade por meio de uma situação pouco vivida por eles e muito comum entre mulheres.
Ficha técnica:
Direção: Bruno Costa
Roteiro: Bruno Costa, William Biagioli
Nacionalidade e Lançamento: Brasil, 23 de janeiro de 2021 (pré-estreia: 24ª Mostra de Cinema de Tiradentes)
Sinopse: Maycon é um boxeador que treina para retornar aos ringues enquanto divide seu tempo com dois subempregos. Pai de Malu, ele tem sua vida revirada quando se vê na situação de ter que cuidar da filha sozinho. Entre a rotina exaustiva de treinos e bicos para sobreviver a maior luta de Maycon ainda está por ser vencida: Tornar-se pai.
Elenco: Edilson Silva, Maria Luiza da Costa, Stephanie Fernandes, Giovana Soar e Luiz Pazello.
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Não é possível que o diretor Bruno Costa não seja um fã da franquia Rocky Balboa. As cenas dos bastidores, lutas de boxe e treinamento evocam uma paixão pelo universo das lutas nos ringues. Mas “Mirador” é muito mais do que isso.
Mergulhando na vida do protagonista Maycon, o filme mostra a dificuldade de um pai que precisa cuidar da filha sozinho e se vê em uma situação muito que é muito mais comum na vida das mulheres. Com isso, Maycon precisa deixar a filha com outras pessoas para conseguir levar seus diferentes trabalhos.
Em certo momento, me lembrei de uma cena de “Café com Canela” que explorava o afeto masculino. É isso que “Mirador” busca na figura do protagonista, mas de forma natural, sem poesia e sem melodrama. Vemos os acontecimentos se desdobrarem sem necessariamente um efeito cascata: apenas seguindo o fluxo da vida.
Assim, conseguimos imaginar o que se passa na cabeça do protagonista, que se esforça para continuar lutando boxe, sua paixão, a despeito dos acontecimentos. Mas “Mirador” também não é uma história necessariamente de superação. É mais uma história de transformação. Transformação da forma de encarar a vida. Das prioridades. E da manifestação do afeto.
Tangencialmente, o filme também não discute apenas o lugar da masculinidade: apresenta questões do racismo estrutural e preconceito regional, já que o protagonista carrega consigo essas lutas históricas.
Vale destacar, aqui, o trabalho com a bebê, que fala o que é preciso para as cenas, considerando a dificuldade que é filmar com crianças dessa faixa etária. E que criança fofa!
O surgimento de uma personagem, já na segunda metade, tem o efeito de simbolizar a filha de um pai ausente, como se mostrasse uma situação oposta à do personagem. Mesmo assim, sua função na história acaba sendo providencial demais.
A luz e a naturalidade com que Mirador conta sua história fazem com que a trama tenha seu impacto e fuja do perigoso sentimento de supervalorização do homem na situação de Maycon. Ele não é especial. Talvez funcione, para ele, a famosa frase: “não faz mais que a obrigação”. E talvez seja aí que resida o propósito do filme: é o fato de ser uma história de “exceção” que fortalece seu simbolismo.