Crítica: Mães de Verdade – 44ª Mostra de São Paulo
“Mães de Verdade” é um melodrama sobre adoção que pode emocionar muito (ou não).
Programação da 44ª Mostra de São Paulo
Ficha técnica:
Direção: Naomi Kawase
Roteiro: Naomi Kawase, Izumi Takahashi, Mizuki Tsujimura
Nacionalidade e Lançamento: Japão, 22 de outubro de 2020 (44ª Mostra de São Paulo)
Sinopse: Kiyokazu Kurihara (Arata Iura) e Satoko (Hiromi Nagasaku) são um casal que, no desejo de ter um filho, adota um bebê. Seis anos depois, enquanto vivem um feliz casamento, eles recebem uma ligação de uma mulher chamada Hikari Katakura (Aju Makita), alegando ser a mãe biológica de Asato (Reo Sato), o filho adotado do casal.
Elenco: Miyoko Asada, Tetsu Hirahara, Arata Iura, Hiromi Nagasaku, Aju Makita, Reo Sato.
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Ao ouvir sobre sua condição médica – não tão grave – Kiyozaku age como se estivesse com os dias contados. Mais tarde, conta a seu amigo sua situação de maneira tão dramática que não parece condizer com sua realidade. O filme da premiada cineasta japonesa Naomi Kawase, por este e outros momentos, torna-se um melodrama sem muito motivo para sê-lo.
Não há problema algum em ser melodramático, e “Mães de Verdade” consegue aproveitar essa característica positivamente em diversos momentos: com o depoimento de uma mulher grávida na instituição, com a relação da jovem Hikari com sua família, e especialmente na maioria das cenas lideradas por Hiromi Nagasaku, atriz que carrega em sua expressão uma verdade e um tom dramático controlado que sempre nos levam a compreender perfeitamente a sua dor. É uma pena que, diante de atuação tão boa, os outros atores tornem o melodrama em algo carregado demais.
Em alguns momentos, como no retorno da jovem Hikari à instituição, ou na subtrama com criminosos locais a cobrar aluguel, o drama apenas se estende sem muito propósito, na tentativa de aprofundar-se nos personagens.
Naomi Kawase extrai imagens belíssimas das árvores, do mar e do amor entre os jovens. As imagens combinam harmoniosamente com o mosaico de sentimentos que o filme busca mostrar. A sutileza com que vemos os corpos jovens se tocando e a forma idealizada com que Kawase filma mãe e filho, na contraluz, servem para evocar o carinho e a emoção. É uma pena, portanto, que a forma com que os acontecimentos se mostram não permita que esses sentimentos se concretizem.
A montagem de “Mães de Verdade” infelizmente poderia ser mais eficaz: somos colocados em um vai-e-vem de acontecimentos, que incluem uma situação inicial da família, um flashback para explicar como eles se tornaram pais do menino, um retorno ao momento de incômodo na família, e um flashback que retrata a história da jovem mãe biológica do filho adotado.
Kawase certamente queria mostrar o contexto no qual aquelas pessoas se inserem, e possivelmente não desejava construir algum conflito em sua trama principal. No entanto, a construção entremeada por tempos diferentes, que serviria para criar tensão, acaba por não funcionar com a força que teria se a narrativa fosse linear.
Com um debate sobre maternidade semelhante ao que aparece na minissérie americana Little Fires Everywhere, “Mães de Verdade” acaba perdendo muito do que poderia alcançar devido ao melodrama difuso e ao conflito criado, que se torna pequeno para o que se construiu na narrativa. Mesmo assim, lágrimas podem rolar nos espectadores que forem mais sensíveis às belas imagens e à trilha evocativa. De fato, é um filme bonito.