Crítica: The Wasteland (Irã, 2020) - Cinem(ação) - crítica
Crítica: The Wasteland (Irã, 2020) - Dashte Kamoush
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Crítica: The Wasteland (Irã, 2020)

The Wasteland venceu o prêmio de melhor filme na competição Horizontes do Festival de Veneza.

Ficha técnica:
Direção: Ahmad Bahrami
Roteiro: Ahmad Bahrami
Nacionalidade e Lançamento: Irã, 3 de setembro de 2020 (Festival de Veneza)
Sinopse: Lotfollah é supervisor em uma das últimas fábricas de tijolos não-mecanizadas que restaram em uma região afastada e desolada. O chefe da fábrica deseja falar com os principais funcionários sobre o fechamento do local, mas estes estão desunidos por diversos motivos.

Elenco: Ali Bagheri, Farrokh Nemati, Mehdi Nassaj, Majid Farhang, Mahdieh Nassaj, Touraj Alvand.

Onde tem um povo que possa ser explorado, certamente haverá quem os explore, e quando não for mais lucrativo, esse povo será abandonado. Talvez alguém já tenha dito alguma frase parecida com esta. Na trama de “The Wasteland”, do cineasta Ahmad Bahrami, acompanhamos uma destas histórias que são sempre seguidas do clichê de histórias universais: “poderia se passar em [inserir qualquer país]”.

Há, claro, idiossincrasias do país de origem. Acompanhamos um supervisor de uma fábrica de tijolos que tenta amenizar os problemas enfrentados pelos funcionários locais, intervindo em brigas e incentivando-os a conversar com o chefe – para, quem sabe, suscitar alguma ação mais enérgica dos cansados trabalhadores.

A maneira como Bahrami escolhe contar os acontecimentos é inteligente por dois motivos: primeiro, porque gera curiosidade em relação a como as histórias vão se cruzar, e segundo porque cria suspense a respeito dos desdobramentos. Além disso, é impossível não refletir sobre os paralelos das ações dos personagens, que vivem realidades extremamente parecidas (e o diretor faz questão de mostrá-las em diálogos quase idênticos e uma atitude exatamente igual).

Os funcionários explorados têm muito mais em comum do que têm de diferente, mas certamente o fato de serem curdos, iranianos e azerbaijanos faz com que prestem mais atenção nas disparidades entre eles. O próprio Lotfollah, que tenta estimulá-los a confrontar o chefe, acaba sendo acusado por todos (exceto por Sarvar, mulher que representa mais uma conquista do poder econômico do dono da fábrica).

Cabe, aqui, destacar a cena da atitude igual entre todos os personagens retratados. Deitar-se e se cobrir com um lençol da cabeça aos pés é, além de um lembrete do quanto estão cansados, uma representação sutil da morte. É como se todos estivessem apenas aguardando a morte. A temática é ainda mais pungente no personagem que está na idade de aposentar, e que provavelmente não conseguirá: a tristeza de sua situação é a mesma de tantos trabalhadores mundo afora que precisam suar uma vida inteira de infelicidades no desejo de um dia se aposentar e descansar.

Vale destacar, ainda, as escolhas técnicas de The Wasteland. A fotografia em preto e branco de Masud Amini Tirani evoca a desolação e aridez do ambiente, e o formato de tela apenas evidencia a falta de perspectivas de todos eles. A câmera, que se move lentamente, se aproxima da morosidade do lugar, e muitas vezes demora a acompanhar as ações, gerando o clima de suspense que faz parte de todo o filme, como se alguma reviravolta estivesse sempre à espreita.

Mais do que um comentário social, The Wasteland é um estudo do microcosmo de relações entre os personagens, servindo até mesmo como alerta aos povos do oriente médio, que poderiam conquistar muito mais direitos e vencer injustiças se deixassem para trás as antigas rusgas entre si mesmos. Mas o sistema que os explora e se beneficia dessa desunião é tão poderoso que leva as pessoas a verdadeiros becos sem saída.

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