Medo de morrer e Streaming em tempos de pandemia . . .
O que tem nos atormentado atualmente é a companhia constante do medo. A presente configuração de nossas vidas, que diz respeito a uma fuga dos outros e de uma aproximação necessária de nós mesmos, de facto, tem transformado nosso modo de ver e experienciar nossas vidas. Para além da nossa angústia da morte, há um sentimento angustiante de termos que lidar com nossos próprios subjetivismos ou nossos egos.
A pandemia que nos acomete é algo de anormal e que solidificou-se como condição humana de medo devido ao crescente número de casos confirmados. Não obstante, o facto de sermos bombardeados diariamente com o crescimento das mortes, ainda precisamos lidar tanto com a possibilidade de morrermos ou perdermos alguém que amamos, quanto com o nosso próprio interesse de realizarmos escolhas individuais em benefício de nós mesmos.
O auto-isolamento é uma escolha em prol dos outros e não relaciona-se, por conseguinte, em sermos obrigados a estarmos isolados uns dos outros, uma vez que tal decisão deve existir com o intuito de não prejudicar o próximo. Logo, não precisamos de um governo que nos imponha a ficarmos em casa, mas necessitamos de uma consciência geral de que temos a responsabilidade de nos afastarmos dos outros. Não obedecemos, no entanto, passivamente o que nos é comandado, mas estamos a decidir em prol do humano. A solidariedade em não sermos agentes de contaminação é mais grave do que qualquer olhar político diante da curva crescente desse novo coronavírus. O medo, no caso do vírus, além de fazer referência ao que não nos é familiar, como o nosso isolamento por exemplo, além disso, nos acomete de desconhecimento absoluto sobre ele, portanto, é o desconhecido, de facto, que é aterrorizante.
Todavia, estamos a conhecer o sentimento de estarmos conectados uns aos outros, nesse caso, de percebermos a valer o que é estar vivo num mundo globalizado. José Gil, um autor português, disse recentemente num artigo o seguinte: “[…] para além do que separa os homens, há o que os faz simplesmente humanos, a vida, a morte, o poderoso direito a existir […]”, ou seja, é esse afeto e estima pelo próximo que gradualmente tem se tornado presente e essencial nas nossas vidas. Portanto, a força vital de todos em prol de um único propósito, este o de preservar a vida, nos põe em dúvida da própria capacidade de exercermos a nossa humanidade, e tal como o medo, nos contagia.
Bom, apesar do medo e da angústia atual, temos que viver e sobreviver. Muito tem se falado, e de forma demasiada, que temos que fazer algo, sermos pró-ativos, porém, não temos mesmo que fazer alguma coisa. Na verdade, temos que simplesmente estar e ser nesse tempo sombrio. É um momento de reflexão e de abandono de um mundo que já foi, já que é preciso pensarmos sobre o pós-coronavírus. Não habitaremos o mesmo mundo.
O streaming é uma ferramenta nova e que veio pra ficar. Ela nos entretêm, nos abandona de nós mesmos, faz do ócio criativo algo solene e mais morno do que uma leitura, do que um debate, do que o próprio cinema faz: comunhão e uma experiência plural entre seres distintos em prol de algo, independente do que seja, mas juntos, ao mesmo tempo – literalmente.
Entretanto, independente disso, as salas de cinema, por hora, ficarão vazias. As salas das nossas casas, nossos quartos, living-room´s, etc, estas sim, serão contaminadas de tanta presença que os conteúdos terão que driblar seus tempos únicos de produção para assim atender a alta demanda de público.
Então, aqui vai algumas dicas: duas séries e dois filmes: todos eles, de diferentes segmentos e distintos prazeres.
Happy Endings – HULU
Chef´s Table – NETFLIX
What Lies Beneath Down East
Making a Mess of Madam C.J. Walker