Voando Com Frances Farmer.
Uma mulher a frente de seu tempo é aquela que enxerga o mundo fora da caixinha hipócrita. É aquela que consegue ver através dos olhos dos outros, com empatia e amor ao próximo. Frances Farmer(1913-1970) foi além. Ela não tinha medo de se expressar. Suas ideias eram uma ofensa para a sociedade conservadora. Questionava Deus em redações de colégio e quando foi para Hollywood, nunca fugiu ao seu ideal primordial como artista: juntar dinheiro com os filmes para seguir sua paixão pelo palco. Seu sonho era a Broadway. Por algum tempo Frances até conseguiu manter este propósito, porém, o star system era algo que ela não estaria disposta a aturar. Sugava demais suas energias ser uma estrela glamourosa, obediente, subserviente aos chefões de estúdio. Esteve em êxtase quando nos palcos, no final dos anos 30, estrelou a aclamada peça de Clifford Odets, “Golden Boy”. Permaneceu no teatro até 1939, abalada com os péssimos roteiros de filmes que eram oferecidos a ela.
Ela se contrapôs à tirania. Continuou falando. Nunca parou de falar. Se rebelou. Enquanto filmava suas cenas, seu lado artista sensível chegava ao diretor ou seus assistentes, e então ela dava palpites sobre como “melhorar” um detalhe e trazer mais realismo ao filme. Claro que isso não era aceito. Ter voz na Hollywood dos anos 30 não era direito das mulheres. Frances acabou sucumbindo a um sentimento de tristeza por achar estar fazendo parte de um mundo fútil. Para ela, Hollywood era sim um lugar fútil. Quando foi presa, após ter tido seu carro parado por um policial, Farmer se viu num circo onde ela era a protagonista, sem querer ser: da imprensa sensacionalista, que batia fotos dela numa situação tão delicada. Os donos do circo queriam e conseguiram expôr a jovem atriz.
Ali estava ela com seu cabelo desarrumado, roupas amassadas, seu rosto sofrido. Queriam domesticá-la, como se ela fosse uma fera. Não conseguiram. Não era fera e sim alguém de forte personalidade. Alguém que queria ser ouvida, sentida e fazer reconhecer ali a necessidade do livre pensamento. Da mulher como um ser humano e não como um mero adorno. Então, desafiando o sistema, foi posta aos olhos do público como louca. Trancafiada em sanatórios públicos, com choques elétricos tentando deteriorar seu brilhante cérebro. Sofrimento que levou quase uma década.
Frances Farmer hoje é muito pouco lembrada como atriz, mas sua conduta indomável tem sido exemplo de resistência, espalhada em filmes e documentários. E assim ela tem sido, aos poucos, redescoberta. Indomável sim. Domesticada nunca. Frances é atualmente símbolo de um espírito livre, da maneira como todos nós deveríamos ter o direito de ser e existir. Existência livre, pensamento livre. Humana em sua plenitude. Nasceu em Seattle, EUA, em 19 de setembro de 1913. Faleceu precocemente aos 56 anos de idade, em 1970, vítima de um câncer de esôfago. Dentre os filmes que fez em seu curto período nas telas, destacam-se “Son Of Fury” (1942 dir: John Cromwell), “Flowing Gold” (1940, dir: Alfred E. Green) e “Come And Get It”, (1936, dir: Howard Hawks, William Wyller e Richard Rossom). Foi interpretada por Jessica Lange na cinebiografia “Frances”, de 1982.