Embrafilme 50 Anos – A História da Precursora da Ancine Pt. 1
Dia 12 de setembro fez 50 anos da criação da Embrafilme. Conheça a sua história.
No dia 12 de setembro de 2019 a Embrafilme completou 50 anos. No mês de setembro publiquei um texto com os principais filmes da era Embrafilme, agora é hora de entender o que foi a Embrafilme, como ela funcionava, conhecer o seu auge e entender como ocorreu o seu fim.
Os precedentes da Embrafilme
Até o final da década de 20, o cinema nacional era bem amador e direcionado para a educação. A partir da década de 30, com o crescimento do cinema de Hollywood, o cinema nacional começou a se industrializar e profissionalizar. E desde os primórdios o Estado começou a se envolver com a expansão do cinema brasileiro. Como não havia produtoras e distribuidoras, esse papel ficava restrito a produtoras e distribuidoras americanas, que não tinham tanto interesse nisso. Pensando nisso, em 1931, o então presidente Getúlio Vargas, criou uma comissão para poder analisar a situação de nosso cinema.
A intervenção do Estado no cinema fica clara em 1932, quando o Governo Vargas passa a usar o cinema como propaganda politica. A partir daí o cinema nacional passou a ser pauta de discussão. A preocupação do Estado com o cinema fez com que se criassem leis e regras para o desenvolvimento do cinema nacional. Inclusive é da era Vargas a obrigatoriedade de exibição de filmes nacionais, tão criticada hoje. Essa obrigatoriedade não é criação da Ancine, nem da Embrafilme, ela vem da Era Vargas, mas mesmo com o objetivo de expandir o cinema nacional, ela sempre colocou nosso cinema como mero coadjuvante diante de produções internacionais. Essa preocupação fez com que surgisse em 1934 o DPC (Departamento de propaganda e Difusão Cultural), que em 1939 foi substituído pelo DPI (Departamento da Imprensa e Propaganda), órgão que estava preocupado com a expansão da cultura nacional. Em 1937 foi criado o primeiro órgão para expandir o cinema nacional o INCE (Instituto Nacional de Cinema Educativo).
Criado por Roquete Pinto, o INCE tinha um objetivo educativo e serviu de escola para diversos profissionais do cinema. Mas ao mesmo tempo que auxilou, o INCE retardou o desenvolvimento do cinema nacional, por se focar em obras educativas e culturais. Nessa época Getúlio teve uma influência nas decisões e regulamentações do cinema nacional. Por essa ocasião, em 1937, Getúlio deu um Golpe de Estado, cancelou as eleições, permaneceu no poder e criou o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), órgão censor de todos os meios de comunicação inclusive o cinema.
Em meio a tanta intervenção estatal, surgiu em 1930, a Cinédia, uma das primeiras produtoras brasileiras criada por Adhemar Gonzaga. A produtora foi responsável pela popularização da chanchada e de atores como as irmãs Aurora e Carmem Miranda, Oscarito, Grande Otelo, Dercy Gonçalves, Dircinha Batista, Carmem Silva e Mesquitinha. A Cinédia foi responsável por filmes importantes para o cinema nacional como Limite, o melhor filme nacional segundo a Abraccine, Descobrimento do Brasil, primeiro filme nacional a passar no Festival de Veneza, O Ébrio, uma das maiores bilheterias nacionais na década de 30, e é claro as chanchadas como Alô, Alô Brasil, Alô, Alô Carnaval e Joujoux e Balangandãs.
Em 1941 surge outra importante produtora brasileira. Criada por Moacir Fenelon e José Carlos Burle, a Atlântida Cinematográfica, um dos nomes mais importantes do cinema das décadas de 40 e 50. A produtora serviu para lançar José Lewgoy, Anselmo Duarte, Eva Todor, Zezé Macedo, Ivon Curi e Jorge Dória, e consolidou Oscarito e Grande Otelo como os astros do cinema nacional das décadas de 40 e 50. Entre os principais filmes da Atlântida se destacam Nem Sansão Nem Dalila, Matar ou Correr, Aviso aos Navegantes, O Homem do Sputinik, Carnaval Atlântida, entre dezenas de outros filmes.
Em 1947 foi criado o CNC (Conselho Nacional de Cinema). A principal função do CNC era regular as normas de produção, exibição e distribuição dos filmes no Brasil. Proposto por Jorge Amado, o CNC propôs concessões de subvenções, empréstimos, e etc. para que as empresas conseguissem produzir ao menos dois filmes. No embalo do sucesso da Atlântida, da Cinédia e da criação do CNC, surgiu outra importante produtora de filmes a Vera Cruz.
A Companhia Cinematográfica Vera Cruz, foi criada em 1949 pelo italiano Franco Zampari e Ciccillo Matarazzo. A produtora durou pouco, apenas 5 anos, mas nesse período distribuiu, produziu e coproduziu mais de 40 filmes como Caiçara, Tico Tico no Fubá, Sinhá Moça, O Cangaceiro, seu maior sucesso. Ainda em seus 5 anos a Vera Cruz lançou para o mundos os diretores Tom Payne e Lima Barreto, consagrou Tônia Carrero, e criou o maior nome do cinema nacional Amácio Mazzaropi. Foi a Vera Cruz que lançou o primeiro filme de Mazzaropi, Sai da Frente, e também o seu primeiro grande sucesso Candinho.
Na década de 50, o CNC perdeu sua força, e com isso outras associações e comissões para fomentar o cinema nacional. Entre ela a APC (Associação Paulista de Cinema), que foi fundamental para a melhora da situação de nosso cinema. Além da APC, foi criada também Comissões Municipais de Cinema no Rio e em São Paulo. Também nessa época foi criada a Comissão Federal de Cinema, a CFC, que substituiu o CNC, que estava em decadência desde o início da década de 50.
Foi graças APC, que foi viabilizado importantes encontros para o cinema nacional na década de 50. Em setembro de 1952 foi realizado I Congresso Nacional do Cinema Brasileiro, no Rio de Janeiro, e em dezembro de 1953 o II Congresso Nacional do Cinema Brasileiro, em São Paulo. Inclusive nesse último congresso, foram feitas muitas reivindicações, que inclusive foram implementadas ao longo dos anos, em especial com a criação da Embrafilme.
Década de 60 o tempo da mudança
Após esses congressos o cinema nacional começou a crescer. Embora a falência da Vera Cruz, em 1954, tenha sido um baque, em 1958 foi criado o GEIC (Grupo de Estudos da Industria Cinematográfica). Esse grupo foi dedicado ao estudo do cinema nacional e foi útil para o desenvolvimento do cinema nacional. Em 1961 o GEICINE (Grupo Executivo da Indústria Cinematográfica) foi criado, com o objetivo de dar maior incentivo e atenção para o cinema nacional. Esse grupo deu prosseguimento as reivindicações propostas nos congressos patrocinados pela APC. As reivindicações atendidas pelo GEICINE foram:
- definição de ‘filme brasileiro’ ;
- estudo sobre a possibilidade de instalação de fábrica de película virgem no Brasil;
- isenção de impostos e taxas diversas, relativa à importação de máquinas e equipamentos para a instalação de fábricas de equipamentos e máquinas para estúdios e laboratórios para os mesmos fins;
- regulamentação da publicidade em cinema;
- reduzindo a tarifa aduaneira de 10% para 5% para a importação de filmes virgens;
- fixação das normas para financiamento da produção de filmes;
- elevação do imposto de renda de 25% para 40% sobre a remessa de divisas para o exterior;
- elevando de 42 para 56 o número de dias por ano de exibição obrigatória de filmes brasileiros, em todos os cinemas existentes no Brasil;
- isenção de depósitos compulsórios para a importação de filme virgem;
Com esse avanço surgiu o INC (Instituto Nacional do Cinema). Criado através do Decreto de lei nº 48, de 18/06/1966, esse instituto foi criado para promover e estimular o desenvolvimento das atividades cinematográficas no país. Além disso ele tinha o objetivo de formular e executar uma política governamental relativa à produção, importação, distribuição e exibição de filmes, bem como o desenvolvimento da indústria cinematográfica brasileira, o seu fomento cultural e sua promoção no exterior. Dessa forma pela primeira vez, de forma mais explicita e incisiva, o estado passou a financiar obras cinematográficas brasileiras.
Subordinado ao MinC, o INC tinha duas linhas a universalista e a nacionalista. A universalista, que era controlada pelo GEICINE, defendia a centralização da administração do desenvolvimento do sistema, bem como uma política liberal para importação de filmes. Já a área nacionalista, defendia que os cineastas tivessem um controle e participação total da produção e recusava o uso do dinheiro estrangeiro. O INC serviu para desenvolver e industrializar o cinema nacional, abrindo assim caminho para o surgimento do Cinema Novo e para a criação da Embrafilme.
O Cinema Novo, que merece um artigo para chamar de seu, foi um movimento que marcante de nosso cinema. Sempre com contexto social, econômico e politico, os filmes fizeram sucesso nos principais festivais mundo a fora. Além disso esse movimento serviu para lançar e concretizar as carreiras de grandes cineastas como Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos, Leon Hirzsman, Helena Solberg, Paulo César Saraceni, Rui Guerra e tantos outros. O Cinema Novo foi fundamental para criação da Embrafilme, afinal muitos entusiastas da empresa estavam diretores do Cinema Novo como Glauber.
E enfim a Embrafilme foi criada! Mas essa história já está muito longa né? No próximo texto veremos a criação, a época áurea, a decadência e o fim da Embrafilme. Até lá!
Fonte de Pesquisa: O Papel da Embrafilme no Desenvolvimento do Cinema Brasisleiro – Monografia em Bacharelado de Priscilla Passos Coelho para UFRJ.