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“It: Capítulo Dois”: rosto do palhaço Pennywise em um fundo totalmente branco, que se mistura com seu rosto
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Crítica: It: Capítulo Dois

“It: Capítulo Dois” passa de raspão em muita coisa boa, mas esquece de ir além da superfície.

Ficha técnica:
Direção: Andy Muschietti
Roteiro: Gary Dauberman
Nacionalidade e Lançamento: Estados Unidos, 2019 (5 de setembro de 2019 no Brasil)
Sinopse: 27 anos depois dos eventos de “It – A Coisa”, Mike percebe que o palhaço Pennywise está de volta à cidade de Derry. Ele convoca os antigos amigos do Clube dos Otários para honrar a promessa de infância e acabar com o inimigo de uma vez por todas.

Quando nos tornamos adultos, é normal deixarmos para trás aquilo que fomos quando crianças. Esquecemos das alegrias, mas também esquecemos dos traumas.

E talvez sejam justamente os problemas, os horrores e medos vividos na infância que precisem ser relembrados. São eles que nos fazem ser quem somos. É mais fácil quando nos esquecemos: seguimos adiante sem pensar muito. Voltar ao passado é doloroso e frequentemente exige uma força que não sabemos que possuímos.

“It: Capítulo Dois” é sobre isso. É sobre trazer à luz o que ficou nos escombros da memória.

Neste caldeirão de sofrimentos estão especialmente os pais abusivos ou ausentes e o bullying. A própria turma de amigos, os “losers” (ou “otários”) se baseia no fato de serem os “deixados de lado” da escola.

“It: Capítulo Dois” é como uma espécie de “terapia final” para todos os membros do “Clube dos Otários”, e essa premissa por si só é interessante, bem como a abordagem de uma temática importantíssima logo no prelúdio do longa. A situação é protagonizada pelo ator e diretor Xavier Dolan, e serve para abordar tangencialmente algo que torne o filme mais conectado aos debates do mundo em 2019. Embora isso seja bom, resvala em algo que o longa terá durante seus 169 minutos: abordagens tangenciais.

Ao contrário do primeiro filme, que se voltava apenas às crianças e seus medos, em “It: Capítulo Dois” os temas parecem ser apenas “pincelados”, sem tanto aprofundamento. Um problema muito comum em adaptações de livros com tramas repletas de personagens. Tenta-se mostrar tudo e aprofunda-se muito pouco nos personagens adultos. Quase todos os personagens estão mais maduros e possuem algum tipo de medo ou trauma a ser superado (e os que não amadureceram ao longo dos anos e nem mesmo durante a trama acabam tendo destinos mais trágicos). O problema é que isso é pouco explorado: tudo o que vemos são os personagens em suas jornadas pessoais enfrentando o palhaço Pennywise, e sempre de maneiras que podem até ser criativas e tensas, mas raramente fazem o espectador temer por suas vidas.

Ao fazer referências metalinguísticas – seja citando os finais ruins dos livros de Bill, ao ter o grande diretor Peter Bogdanovich falando sobre como as pessoas gostam de finais felizes, e com a aparição do próprio Stephen King – “It: Capítulo Dois” transparece uma autoindulgência que pouco ajuda, ainda que traga algum tipo de humor, que aliás é responsável por parte dos bons pontos do filme (mesmo com a insistência de piadas de quinta série que citam a mãe do outro). O gênero do horror sempre flertou com o humor, e o fato de esta nova franquia do Pennywise ser também uma homenagem ao cinema do gênero dos anos 1980 permite resgatar o clima que muitos deles traziam. O problema, no entanto, é que muitas das falas que fariam sentido em “turminhas do barulho” de adolescentes são muitas vezes ditas por adultos, o que deixa tudo um pouco menos verossímil e contribui para a redução da tensão. No fim, “It: Capítulo Dois” é um filme que poderia ser bem mais curto e conciso, e que repete algumas temáticas já do primeiro filme. Em vez do horror sugerido ou repleto de tensões do primeiro, este consegue mostrar o horror da violência gráfica e explora especialmente o ataque a crianças. A compreensão das transformações dos personagens fica mais na superfície, perdendo a oportunidade de explorar mais de suas camadas. E ao mesmo tempo em que a mensagem a respeito do bullying e do preconceito parece ser o mais interessante de tudo, é uma pena que a forma de derrotar o Palhaço seja com os mesmos “golpes” que eles levaram a vida toda: deixa claro o poder das palavras proferidas em direção a alguém, mas também valida a possibilidade de dizê-las.

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