Marvel vs. DC
Em 1976, as editoras Marvel e DC Comics se juntaram para um crossover com o mais famoso personagem de cada uma delas se enfrentando. “Superman vs. the Amazing Spider-Man: The Battle of the Century” mostra o Homem de Aço enfrentando o aracnídeo em uma trama que envolve os vilões Lex Luthor e Doutor Octopus. Aqui no Brasil, essa história foi publicada pela editora Abril em 1986, com o título “Super-Homem Contra Homem-Aranha: O Encontro do Século”, e depois republicada pela mesma editora na edição número 1 da coleção “Grandes Encontros Marvel & DC”.
A continuação, porém, foi a primeira a ser publicada no Brasil; pela editora Ebal em 1982, e pela editora Abril em 1989 (republicada em 1993, como a quarta edição da coleção “Grandes Encontros Marvel & DC”. Outros crossovers com rivalidades entre personagens da Marvel e a DC foram “Batman Versus O Incrível Hulk”, “Darkseid vs Galactus: O Devorador”, “Justiceiro & Batman: Cavaleiros Mortíferos”, “O Incrível Hulk vs Superman” e “Liga da Justiça e Vingadores”, além de alguns outros.
Infelizmente, a rivalidade entre a Marvel e a DC não termina nessas histórias, mas se estende em outro âmbito: o público. Nas redes sociais, principalmente, há uma rivalidade entre Marvetes e DCnautas que torna o gosto pelos personagens uma zona de discordâncias e de conflitos. Não se sabe exatamente como e onde isso começou, mas sabe-se que as redes sociais ajudaram a alastrar essa disputa de “quem é melhor”: Marvel ou DC? Em diversas publicações e comentários de artigos e postagens sobre super-heróis em sites e grupos da internet, é muito fácil ver ataques e ofensas trocadas entre admiradores da Marvel e da DC.
Uma questão curiosa e tensa, porque leva toda aquela rivalidade dos campos de futebol para o meio artístico das HQs. Será que reside nisto tudo uma necessidade em se apegar a algo e tentar torná-lo insuperável ao ponto de ter que menosprezar o outro? Ler HQs e assistir aos filmes de super-heróis se tornou uma competição? Isto tomou forma depois dos filmes. Alguns fãs Marvel torcem para que os filmes da DC não sejam bons e nem façam sucesso, e, da mesma forma, alguns fãs da DC torcem para que a Marvel não se saia bem com seus filmes.
Podemos dizer que tanto uma quanto a outra tem suas qualidades e seus defeitos, seus sucessos e seus fracassos, suas ascensões e seus deslizes. Nasceram basicamente na mesma época, produziram grandes personagens e grandes histórias. E engana-se quem acha que os donos e artistas dos estúdios e editoras da Marvel e DC entram nessa onda de rivalidade. Pelo contrário, eles são amigos, discutem projetos, sabendo eles que dedicação e boas ideias valem mais que disputas desnecessárias. Leitores mais antigos também fogem dessa rivalidade.
Faço parte da geração dos anos 80, quando as editoras brasileiras começaram a investir de forma mais massiva nas publicações das grandes HQs. Foi também nessa época que surgiram obras memoráveis como “Watchmen”, “Batman – O Cavaleiro das Trevas”, “Demolidor – A Queda de Murdock”, “Surfista Prateado – Parábola” e “Crise nas Infinitas Terras”, entre outras. Exceto alguns encadernados como “Elektra Assassina” e “Ronin”, e revistas mensais ou bimestrais como “A Espada Selvagem de Conan” e “Aventura e Ficção”, assim como graphics novels, não tínhamos tantas HQs em formato grande – e muito menos capa dura – como se tem nos dias de hoje. Aquela era a época dos “formatinhos”, das histórias em séries, de títulos como “Superaventuras Marvel”, “Superamigos”, “Capitão América”, “Super-Homem”, “Heróis da TV” e “Os Novos Titãs”.
Naquele tempo não havia rivalidades, falávamos “a mesma língua”, e o que queríamos era ver aqueles personagens e aquelas histórias fazendo sucesso e vir mais e mais publicações. Nosso sonho na época também era ver nossos personagens preferidos em produções cinematográficas. Tínhamos apenas “Superman – O Filme” (de 1978) como referência maior e depois “Batman” (de 1989). Como não existia internet popular na época, não tínhamos redes sociais e aplicativos de mensagens que dessem maior voz a nós leitores no intuito de pedir para que os estúdios investissem em filmes de super-heróis, independente se eles fossem da Marvel ou da DC. Claro que queríamos ver todos eles nas telonas do cinema. Mas isso só começou a ganhar maior forma e força, como sabemos, no final dos anos 90.
João Gustavo Rosa, criador e apresentador no canal Caldeirão Nerd, é um dos maiores conhecedores de HQs e filmes da Marvel e DC. Perguntei o que ele achava dessa rivalidade do público de hoje com a Marvel e a DC. Vejamos o que ele respondeu:
“Eu acho uma besteira esse tipo de rivalidade. Nós que gostamos de cinema, gostamos do bom cinema, bons filmes, não importa se é Marvel, não importa se é DC, não importa se é Image, nós gostamos acima de tudo de cinema. Eu não sou fã de Marvel nem DC, eu sou fã do Superman, que por um acaso é da DC, mas o meu segundo herói favorito é o Conan – que agora voltou pra Marvel -, e o terceiro é o Justiceiro, está entendendo? Eu quero dizer assim: hoje em dia o chamado nerd, o nerd bazingueiro – que é aquele que foi criado em 2008 pra cá – que é aquele nerd que acha que a Marvel nasceu em 2008, e tudo que vem antes não importa, só liga pros filmes; esse nerd cresceu com os filmes da Marvel, ele só consegue enxergar os filmes da Marvel, ok?; isso criou uma reação em cadeia, porque a DC vinha na contrapartida; a DC fazia filmes mais adultos, mais sombrios, mais sérios, vamos colocar assim; calcados no universo do Nolan. Só que a galera mais nova não gostava dos filmes da DC, porque de fato eles são mais difíceis de você se relacionar, porque o Superman é um homem perfeito, a Mulher-Maravilha é uma mulher perfeita, porque o Batman é a excelência física do ser humano, e assim por diante; enquanto os personagens da Marvel são mais humanos. Na verdade, Stan Lee não criou super-heróis, ele criou seres humanos que por acaso tinham super poderes, e isso se reflete nos dias de hoje, na preferência da galera. Então assim, hoje em dia você tem de gostar de uma e automaticamente odiar a outra; isso é automático, sabe. Mas o ser humano sempre teve essa rivalidade, né. Mas tanto faz se é Marvel ou DC, o que importa é se o filme é bom ou não, e não ficar criando essa rivalidade. É bobeira, é muita bobeira.”
Nas últimas semanas tivemos uma grande demonstração de rivalidade entre Marvel e a DC, quando várias pessoas, em um desnecessário boicote, resolveram negativar a nota do filme “Capitã Marvel” em um prestigiado site de referência mundial, antes mesmo do filme ter estreado nos cinemas. Se é para falar mal de um filme, que seja de forma justa, não no intuito de diminuí-lo para enaltecer o lado que se torce, uma vez que uma torcida justa seria por todos, independentemente se é Marvel ou DC. Cinema e HQ não são torneios em campo onde se torce por um e espera a derrota do outro. No cinema, se um filme é bom, o público só tem a ganhar.