Festival de Berlim 2019: Brasil tem 3 obras premiadas
No último domingo dia 17/02 o Festival de Berlim anunciou seus vencedores, incluindo 3 filmes brasileiros
O Festival de Berlim 2019 chegou ao fim. E o Brasil sai de Berlim com um saldo bastante positivo. Esse ano o Brasil esteve presente com 12 filmes diferentes. Os documentário Rise e Espero Tua (Re)volta e a ficção científica Breve História do Planeta Verde saíram premiados do Festival, esses dois últimos inclusive com dois prêmios cada. E o filme Marighella, o único filme nacional na mostra principal saiu aplaudido do Festival.
O documentário Rise, dirigido por Bárbara Wagner e Benjamin Burca, chegou com moral em Berlim esse ano. A dupla, que fará parte da Bienal de Veneza, foi um dos destaques do release de curta-metragem do Festival. O filme, que foi realizado graças ao Prêmio Pipa 2017 vencido por Bárbara, foi filmado na periferia de Toronto, e mostra a vida de jovens do RISE, um projeto criado pelo poeta Randell Adjei no qual ele incentiva os jovens a contar sua história através da música. O curta, que era esperadíssimo no Festival, fez por merecer e saiu com o Prêmio Audi de Curta Metragem. O prêmio, patrocinado pela Audi AG, é um dos mais cobiçados e importantes do Festival de Curtas , ficando atrás apenas do Urso de Ouro e de Prata. Bárbara e Benjamin saíram com o troféu e um prêmio de € 20.000,00 (vinte mil euros), o equivalente a R$ 84.400,00, o que é uma ajuda e tanto para os cineastas de curta metragem, já que a maioria deles não tem espaço nos cinemas e fica restrito a festivais, ainda mais no Brasil.
Outro documentário que fez bonito em Berlim esse ano foi Espero Tua (Re)volta, de Eliza Capai. O documentário aborda as os movimentos estudantis que ganharam força a partir de 2015 quando jovens passaram a ocupar escolas estaduais em todo o Brasil. Acompanhando três jovens do movimento e com imagens de arquivo de manifestações desde 2013. O filme de Eliza participou da mostra Generation, que dá espaço a filmes com temática juvenil. O filme brasileiro conquistou o público, a crítica e o júri de Berlim e saiu de lá com 2 prêmios. O primeiro deles foi o Peace Film Prize. Esse prêmio é concedido anualmente para obras que trazem uma mensagem de paz e que executa de forma habilidosa o tema proposto. E o filme brasileiro faturou o prêmio que consiste em € 5.000,00 (cinco mil euros), o equivalente R$ 21.100,00, e um troféu de bronze.
Além disso, o filme recebeu o Amnesty International Film Award, o prêmio da Anistia Internacional. Esse prêmio, que é dado desde 2005, é oferecido a filmes que falam dos direitos humanos e dá aos filmes grande visibilidade internacional, inclusive entre os vencedores deste prêmio temos 4 indicados ao Oscar: o palestino Paradise Now, indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2006, e os documentários Lixo Extraordinário em 2011, The Square em 2014 e Fogo no Mar em 2017 na categoria Melhor Documentário. O filme de Eliza Capai ao ser premiado além de visibilidade ganhou mais € 5.000,00 (cinco mil euros).
A diretora inclusive fez um discurso bem político ao receber o prêmio:
Fazer o filme foi difícil, mas nem nos piores pesadelos eu poderia imaginar que o filme ficaria pronto em condições tão adversas. É uma honra estar aqui e protestar, para o mundo, contra o governo homofóbico, racista e contra as mulheres que se instalou no País. – Eliza Capai em Berlim
E falando em protesto político como não falar de Marighella, a estreia de Wagner Moura na direção? A cinebiografia do ex-deputado, guerrilheiro, poeta e professor Carlos Marighella, vivido por Seu Jorge no filme, assassinado durante a Ditadura Militar, causou em Berlim. Logo no tapete vermelho a equipe do filme protestou e homenageou a vereadora Marielle Franco, assassinada há quase 1 ano. No tapete vermelho o diretor do filme exibiu uma placa escrita “Rua Marielle Franco”, o diretor inclusive fez um paralelo entre a vereadora e Marighella em entrevista coletiva em Berlim . Ainda no tapete vermelho uma facha escrita “#MariellePresente” foi exibida e gritos de “Ele Não” e “Lula Livre” foram ouvidos.
A Exibição do filme não poderia ter sido melhor. O filme foi ovacionado em Berlim. Após a exibição o filme foi recebido com longos e calorosos aplausos. Durante a entrevista coletiva, o discurso político de Wagner Moura se intensificou. Confira abaixo algumas de suas declarações:
A minha geração é muito alienada, mas os jovens da geração de Marighella deram sua vida por algo no qual acreditavam. Na resistência à ditadura, as pessoas se sacrificavam umas pelas outras. Marighella não só sacrificou a vida na resistência como sacrificou o tempo que poderia passar com seu filho Carlinhos.
Fala-se nas escolas brasileiras na Revolução Francesa, mas não se fala na necessária revolução dos negros no Brasil.
No momento, o governo está refazendo a história brasileira, enquanto os professores já começam a ser vigiados. Já não querem mais que se diga Golpe de 1964, e sim Movimento de 1964. Ao mesmo tempo, procuram criminalizar a arte.
Marighella não foi um super-herói, era um ser humano com suas falhas, uma delas foi a de não ter se preocupado suficientemente com sua segurança, embora tivesse sido autor de um mini-manual do guerrilheiro urbana.
A situação brasileira atual é horrível. É o pior momento para a população negra nas favelas e para a população indígena. O presidente é homofóbico e racista. Nós ficamos no foco ao fazermos esse filme e vir aqui apresentá-lo. Nos deparamos com muita merda e vamos enfrentar muita merda, mas não temos medo. Se for mal para nós do filme, será muito pior para os setores da população ameaçados. O assassinato dos negros têm uma explicação, como disse um policial dentro do filme – se eu mato um negro é porque não posso matar um vermelho.
Marighella, negro, revolucionário, foi assassinado por forças do Estado em 1969 no seu carro e, 50 anos mais tarde, uma vereadora negra morreu da mesma forma nas mãos provavelmente, de agentes do estado.
A violência de 50 anos atrás é a mesma que se emprega hoje contra a população das favelas, e a polícia não está treinada para proteger os cidadãos
O filme foi recebido com grande empolgação pela imprensa internacional, muitos inclusive fizeram um paralelo entre a atual situação do Brasil com os EUA. O filme mesmo antes de estrear para o público em geral, visto que sua estreia foi apenas para a imprensa, já está dando o que falar. Só para ter uma ideia 15 mil pessoas foram ao IMDB para poder dar notas baixas e fazer críticas negativas ao filme. A situação chegou ao ponto de o site bloquear as notas e críticas para o filme. A situação é tal que nem se sabe ao certo se o filme irá estrear comercialmente. Caso não consiga esse espaço os produtores farão exibições independentes e em movimentos sociais. O que seria uma pena, e seria a censura começando a dar as caras.
Abrandando um pouco o tema vamos falar sobre o último nacional premiado em Berlim esse ano, a ficção argentina/brasileira Breve História do Planeta Verde, de Santiago Loza. O filme também saiu duplamente premiado em no Festival de Berlim 2019. O filme conta que conta a história de uma mulher trans, que junto com um amigo gay e uma mulher cis, vai ao enterro de sua avó que faleceu e passou seus últimos momentos com um alienígena. O filme que fazia parte da mostra Panorama foi o grande vencedor do Prêmio Teddy.
O Prêmio Teddy é um prêmio que honra filmes com temática LGBTQ+ que contribuem para a tolerância, respeito, aceitação e solidariedade. Entre os vencedores desse prêmio já tivemos A Lei do Desejo, Minhas Mães e Meu Pai, Hoje Eu Quero Voltar Sozinho e Uma Mulher Fantástica. Agora foi a vez do filme de Loza entrar nessa Lista de vencedores. E entrar de forma dupla, além de receber o prêmio de Melhor Filme, que ainda tinha o filme nacional Greta entre os indicados, Breve História do Planeta Verde levou ainda o Teddy Readers’ Award powered by queer.de, prêmio patrocinado pelo site LGBTQ+ queer.de.
Os vencedores
Nas categorias principais do Festival de Berlim o destaque foi para a comédia dramática Synonyms. O filme franco/alemão/israelense conta a história de um adolescente israelense que foge de seu país e parte para a França, onde vive em Paris enquanto esconde a sua identidade. Tendo como principal companheiro um dicionário de francês-hebreu. O filme levou o Urso de Ouro de Melhor Filme e Prêmio do Júri da Crítica Internacional. Já o Prêmio Especial do Júri ficou com o novo trabalho de François Ozon (Oito Mulheres, O Amante Duplo). By The Grace of God, conta história de 3 amigos de infância diferentes, que 40 anos depois se reencontram para comparar suas vidas e experiências.
A diretora Angela Schanelec se tornou a quarta mulher a ganhar o Urso de Prata de Melhor Diretora pelo filme I Was at Home, But. O filme conta a história de uma jovem estudante de apenas 13 anos que desaparece sem deixar rastros e reaparece misteriosamente uma semana depois. Após isso sua mãe e seus professores são confrontados com questões aparentemente vitais e influentes em seu estranho comportamento. Os prêmio de Melhor Ator e Atriz foram para o chinês So Long, My Son. Yong Mei e Wang Jing-chun foram os premiados ao viver um casal que após perder seu filho afogado, tem de aprender a lidar com as mudanças culturais da China nos Anos 80.
O prêmio de Melhor Roteiro foi para o italiano Piranhas. O filme conta a história de um grupo de jovens de 15 anos que usam de violência para conseguirem o que querem e acreditam ser o melhor caminho. Completando os vencedores do Urso de Prata, o alemão System Crasher , que conta a história uma garota problema de 9 anos que pula de lar em lar adotivo, levou o prêmio Alfred Bauer para filmes que abrem novas perspectivas. E o norueguês Out Stealing Horses, que conta a história de Trod, de 67 anos, que após a morte de sua esposa vai para uma casa no meio da floresta e sua vida passa a mudar ao encontrar um antigo vizinho, ganhou o prêmio de Melhor Contribuição Artística pela fotografia do filme.
A mostra Panorama, que contava com 5 filmes brasileiros, escolheu o filme japonês 37 Seconds como seu favorito. O filme conta a história de Yuma Takada, uma jovem que possui o sonho de ser uma artista consagrada de mangás, mas vê em sua paralisia cerebral um obstáculo extremamente difícil de ultrapassar. Já os críticos escolheram italiano Dafne. Que conta a história de uma garota com Síndrome de Down, que após a morte da mãe é obrigada a se aproximar do pai.
Na área dos Curtas os vencedores foram Umbra, que é um filme experimental dedicado aos fenômenos incomuns da natureza, com o Urso de Ouro de Melhor Curta. E Blue Boy, que mostra um bar de Berlim onde há 40 anos jovens solitários vão em busca de companhia, levou o Prêmio do Júri.
Confira abaixo os principais Vencedores.
Prêmios Principais Mostra Competitiva
Urso de Ouro de melhor filme: Synonyms
Urso de Prata de grande prêmio do júri: By the Grace of God
Urso de Prata de melhor diretor: Angela Schanelec (I Was at Home, But)
Urso de Prata de melhor atriz: Yong Mei (So Long, My Son)
Urso de Prata de melhor ator: Wang Jing-chun (So Long, My Son)
Urso de Prata de melhor roteiro: Piranhas
Urso de Prata – prêmio Alfred Bauer para filmes que abrem novas perspectivas: System Crasher
Urso de Prata – melhor contribuição artística: Out Stealing Horses
Prêmios Secundários Mostra Competitiva
Melhor filme de estreia: Oray
Melhor documentário: Talking About Trees
Prêmios Curtametragem
Urso de Ouro de melhor curta-metragem: Umbra
Urso de Prata de grande prêmio do júri de curta-metragem: Blue Boy
Audi Short Film Award: Rise
Prêmios da Crítica
Melhor Filme: Synonyms
Mostra Panorama: Dafne
Mostra Fórum: Die Kinder der Toten
Mostra Panorama
Melhor Filme: 37 Seconds
Mostra Documentário: Talking About Trees
Para conhecer todos os vencedores acesse o site oficial ou baixe o release com todos os vencedores.