Biografia: Fernanda Montenegro Pt. 1: “Como Tudo Começou”
Conheça a história da Dama da Dramaturgia Brasileira Fernanda Montenegro
No último dia 03 de abril, um dos filmes mais amados do Brasil completou 20 anos. Em 1998 Central do Brasil de Walter Salles conquistou o Brasil e o Mundo. Um país empolgado pela Copa do Mundo da França, se rendeu a uma história simples de amizade e crescimento pessoal de um garoto de 9 anos e uma mulher de quase 70 anos. Um dos filmes mais premiados da história do cinema nacional, Central do Brasil é um marco para o cinema nacional, que “ressuscitou” com o filme de Walter Salles. E uma das grandes responsáveis por isso é Fernanda Montenegro.
A atriz que é uma unanimidade nacional, encantou o Brasil e o Mundo com Dora, a professora aposentada que escreve cartas para sobreviver. Essa personagem deu a atriz uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz em 1999, o que fez dela a primeira e única atriz brasileira até hoje indicada ao prêmio. Mas Fernanda Montenegro é muito mais do que Dora. A atriz tem uma das carreiras mais brilhantes da dramaturgia brasileira. Unanimidade no Teatro, na TV e no Cinema ela merece todas as homenagens possíveis, e ainda será pouco. Por isso o Cinem(ação) presta uma singela homenagem para a Dama da Dramaturgia Brasileira.
O início de tudo
Nascida em 16 de outubro de 1929 no Rio de Janeiro, recebeu como nome de batismo Arlete Pinheiro Esteves da Silva. Filhos de imigrantes portugueses, por parte de pai, e italianos, por parte de mãe, a atriz cresceu no subúrbio do Rio, em uma família simples, que tentava se adaptar a vida na cidade grande. Seu pai era artesão, “um artista”, como diz a atriz na sua biografia publicada na Coleção Aplausos da Imprensa Oficial. Sobre seu pai a atriz ainda diz:
Se eu tenho alguma arte em mim, ela veio do meu pai. O que ele fazia era regido pela ideia de que tudo tem sua arte. Ele não dizia arte, dizia ciência: “Tudo na vida, minha filha, tem uma ciência”. O que hoje eu traduzo: Tudo na vida é uma arte.
Já sua mãe, como a própria atriz diz era a administradora da casa. E uma boa administradora. Uma mulher companheira e poderosa.
Com 15 anos, enquanto fazia um curso de secretariado, Arlete ouviu uma chamada para um curso de radialista na Radio do Ministério da Educação e Cultura. Ela se inscreveu e em pouco tempo passou a fazer parte do elenco de colaboradores da Rádio Teatro da Mocidade, onde apresentavam peças, biografias, adaptações de romances e contos. Assim Arlete, como ainda era conhecida começava a dar seus primeiros passos na vida artística.
Na Rádio MEC, a atriz trabalhava como locutora e tinha um programa próprio chamado Passeio Literário, onde adaptou diversos livros da literatura brasileira e mundial. Segundo Fernanda, ela trabalhava com muita felicidade e sua passagem na Rádio, que foi de 10 anos, foi a faculdade que ela não fez de forma acadêmica.
Na verdade, a Rádio MEC, tem grande importância na formação artística de Fernanda Montenegro. Isso por que foi ali que a atriz adotou seu nome artístico. No início ela era chamada conhecida como Arlette Pinheiro, mas após três anos de rádio, ela começou a adaptar programas culturais e passou a usar o nome Fernanda Montenegro. Adotou o nome por achar que tinha um certo humor pela semelhança com Conde de Monte Cristo e por ter um médico na família chamado Dr. Montenegro. Já o Fernanda ela escolheu por ser um nome a lá século 19. Em pouco tempo todos passaram a chamar de Fernanda. Tanto que o próprio Fernando Torres, marido da atriz, por um bom tempo não sabia que ela era Arlette de batismo. Para ele, ela sempre foi Fernanda.
O Encontro com o Teatro e a TV
Em 1950, Fernanda Montenegro fez sua estreia nos palcos, na montagem da peça Altitude 3.200, de Julien Luchaire. A peça já havia sido montada 10 anos antes pela mesma companhia, com Cacilda Becker no elenco. 10 anos depois Fernanda reprisou o papel de Cacilda na peça. O espetáculo foi um fracasso, mas Fernanda Montenegro foi muito bem tratada pela crítica. Com esse pequeno papel de relativo sucesso, a atriz recebeu um convite para participar de uma esquete na TV, que estava começando a aparecer no final de 1950. Em 1951 no Teleteatro da TV Tupi Fernanda começou sua carreira na TV.
Depois de 2 anos na Tupi, Fernanda voltou ao teatro na peça Loucuras do Imperador, de Paulo Magalhães. Nesse período a atriz teve convivência com grandes nomes do teatro, além de assisti-los em cena, como Ester Leão, Lucília Peres, Ducina Moraes, Procópio Ferreira, Bibi Ferreira. A atriz considera isso uma escola que a formou como a atriz que é hoje. Inclusive foi com essa peça, Loucuras do Imperador que a própria Fernanda disse ser muito ruim, deu a ela o prêmio de atriz revelação. O primeiro de muitos que viriam.
Ainda na Rádio MEC, onde ficou até 1954, Fernanda junto com seu marido Fernando Torres criou e apresentou o programa Falando de Cinema, e a cultura cinematográfica não escapava dela. Entre 1950 e 1954, Fernanda se dividia entre a TV, Teatro e a Rádio.
Em 1953 Fernanda e Fernando se casaram, e no ano seguinte quase os perdemos para a BBC de Londres, que os convidou para se mudar para Londres e fazer programas para brasileiros na rádio. Mas para nossa alegria, e sorte, eles não foram. Eles se mudaram para São Paulo onde passaram a fazer parte da grande estrutura teatral que existia na época. Nesse período Fernanda, juntamente com seu marido, teve o grande privilégio de trabalhar com grandes nomes do teatro como Maria Della Costa, Sandro Polônio, Gianni Ratto e Sérgio Britto.
Reconhecimento da Crítica e Sucesso de Público
Dois anos depois, Fernanda foi para o TBC (Teatro Brasileiro de Comédia) onde participou da peça Eurídice, onde contracenou com Cleyde Yaconis e Walmor Chagas. A peça foi um fracasso de público. Já a próxima peça Nossa Vida Com Papai, que trazia no elenco Nathalia Timberg, Sérgio Britto, Mauro Mendonça, Fernando Torres e Maria Helena Dias, foi um enorme sucesso e ficou 1 ano em cartaz. Essa peça deu a Fernanda o prêmio de Melhor Atriz no Prêmio da APCT (Associação Paulista de Críticos Teatrais). Mas foi com Vestir os Nus que Fernanda conseguiu reconhecimento do público e da crítica. Após essa peça, vieram vários sucessos.
Após a saída do TBC, Fernanda voltou para a Tupi onde junto com Sergio Britto, Fernando Torres e Flávio Rangel produziam semanalmente o Teleteatro adaptando textos diversos e quase sempre adaptados por Manoel Carlos. Com o trabalho na TV, Fernanda Montenegro e seus companheiros, conseguiram dinheiro suficiente para montar uma peça, a escolhida foi O Mambembe, de Artur Azevedo. E em 1959, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, 3.000 pessoas estavam na plateia para a primeira peça do que ficou conhecido como “Teatro dos Sete”. O espetáculo foi um grande sucesso consagrado, com filas que rodeavam quarteirões. A peça deu a Fernanda um novo prêmio, o Prêmio Padre Ventura do Círculo Independente de Críticos de Arte de Melhor Atriz.
Após o sucesso arrebatador de O Mambembe a companhia dos Sete continuou fazendo sucesso atrás de sucessos. Um dos mais celebrados é O Beijo no Asfalto, de Nelson Rodrigues, escrito especialmente para eles, devido a insistência durante 1 ano da própria Fernanda a Nelson. A peça foi um sucesso retumbante, mas que precisou ser interrompido pela crise política que se instaurava no Brasil após a renúncia de Jânio Quadros. Com a situação politica no Brasil se agravando o Teatro dos Sete saiu em excursão pelo Brasil montando seus grandes sucessos, entre eles O Beijo no Asfalto.
Nessa época a atriz engravidou de Cláudio Torres, que foi uma gravidez complicada. Ao voltar para o Rio o Teatro dos Sete montou sua última peça Mirandolina, e Fernanda ficou grávida novamente, agora de Fernanda Torres. Mirandolina ficou em cartaz até a gravidez da atriz permitir. Nessa época a Ditadura Militar e a Censura impediu que várias peças que Fernanda pretendia fazer não fossem montadas. Mas mesmo assim conseguiu fazer alguns sucessos como A Mulher de Todos Nós, O Homem do Princípio ao Fim, Volta ao Lar, Oh! Que Belos Dias, Seria Cômico se não fosse Sério, A Mais sólida mansão e É. Mas muitas peças que a atriz participaria foram proibidas entre elas Um Elefante no Caos, Trivial Simples e Calabar.
Inclusive em fins dos anos 70 quando estavam em cartaz com É, Fernanda e sua família sofreram um atentado, sem feridos. Mas após o atentado ela e os atores do espetáculo começaram a sofrer ameaças de morte no teatro. Chegaram ao ponto de ameaçarem atirarem em Fernanda enquanto ela estivesse atuando. A solução apresentar o espetáculo com as luzes acesas e com seguranças armados.
Mas e o Cinema? Vocês talvez se perguntem. Calma essa é apenas a primeira parte de quatro da biografia de Fernanda Montenegro, a Dama da Dramaturgia Brasileira.
Veja também o texto sobre Fernanda Montenegro na Sessão Coisa Que Você Não Sabia no Cinem(ação)
Fonte de Pesquisa: Coleção Aplauso – Fernanda Montenegro
Para ler a 2ª parte da Biografia de Fernanda clique aqui
Para ler a 3ª parte da Biografia de Fernanda clique aqui