Crítica | Sobrenatural: A Última Chave
Ficha técnica:
Direção: Adam Robitel
Roteiro: Leigh Whannell
Elenco: Lin Shaye, Leigh Whannell, Angus Sampson, Kirk Acevedo, Caitlin Gerard, Spencer Locke, Josh Stewart, Tessa Ferrer, Aleque Reid
Nacionalidade e lançamento: EUA, Canadá, 2018 (18 de Janeiro de 2018 no Brasil)
Sinopse: Nesse filme, que traz de volta a estrela da franquia Lin Shaye no papel da Dr. Elise Rainier, a brilhante parapsicológa irá encarar seus fantasmas mais pessoais e intensos até hoje: a casa de sua própria família.
Se os primeiros filmes da série Sobrenatural funcionavam, era porque seu diretor James Wan – por mais mais divisível que sua figura seja entre os fãs de terror – conseguia executar com certa eficiência os diferentes tipos de terror que propunha, seja aquele de sutilezas e exploração psicológica ou o exagerado trash new wave oitentista. Ainda assim, é curioso notar como em sua própria filmografia, que conta com os sucessos de público e crítica Invocação do Mal 1 e 2, os filmes da série Sobrenatural sejam aqueles que mais dividem o público.
Não é de se espantar: se os filmes da série Invocação do Mal são tão bem recebidos, com seu orçamento inchado e uma proteção de estúdio que o insere num universo conciso mas também propício ao genérico em sua uniformidade, é porque apelam justamente a um tipo de terror mais palatável ao grande público, com uma elegância retrô, mas inofensiva que parece ter feito sucesso justamente por estar esquecida com a chegada dos anos 2000 e seu terror mais extremo e físico – o torture porn. Sobrenatural, no entanto, era um terror barato que perdia boa parte de seu público em seu terceiro ato por se entregar a outro subgênero esquecido – mas claramente de nicho-, com seu neon exagerado, fantasias baratas e muito gelo seco enquanto transitava entre o bizarro e o ridículo. Ainda assim, era uma franquia que no terror atual claramente se diferenciava. Sua grande Scream Queen, afinal, é uma idosa de setenta e quatro anos – a médium Elise vivida por Lin Shaye -, e não alguma adolescente genérica. É triste, então, constatar que Sobrenatural: A Última Chave, o quarto filme da série, tenha se entregado a um caminho que era perceptível já em seu terceiro capítulo, tornando-se apenas mais uma sequência caça-níquel numa franquia que começa justamente a se entregar ao lugar comum.
Se bem dirigido e feito com tesão, o genérico pode até funcionar. Quando é realizado apenas por razões contratuais, no entanto, é difícil extrair muitas qualidades. No filme mais fraco da franquia, acompanhamos a parapsicóloga Elise (Lin Shaye) e seus ajudantes, Specks (Leigh Whannell, que também escreve todos os filmes da franquia, além de ter dirigido o terceiro capítulo) e Tucker (Angus Sampson) resolvendo mais um caso paranormal, desta vez envolvendo a casa na qual Elise cresceu. Se a possibilidade de explorar o passado de uma das personagens mais interessantes da franquia anima, ela é infelizmente desperdiçada pelo roteirista Leigh Whannell, um escritor competente mas que aqui entrega seu pior trabalho. Whannell e o diretor, Adam Robitel, optam por contar uma história despretensiosa e episódica – como muitos dos já mencionados filmes trash da década de oitenta -, e não há, na teoria, nada de errado com a decisão.
O problema é que o inexperiente Robitel e seu diretor de fotografia Toby Oliver filmam Sobrenatural: A Última Chave com um descaso que parece refletir a aventura da vez, como quem reconhece o caráter esquecível de sua própria obra e entrega um trabalho burocrático, de jumpscares que, se já não fossem questionáveis o suficientes narrativamente, são mal arquitetados e consequentemente estéreis. O demônio da vez, chamado KeyFace, apresenta um design estiloso mas uma execução capenga do departamento de maquiagem. Quando James Wan almejava o trash intencional, essa estética do baixo orçamento funcionava. Aqui, na intenção de se enquadrar no padrão, o que se alcança é o trash no sentido literal, o porco.
Não é só nos aspectos técnicos que A Última Chave desaponta. Essa clara desconexão e não entendimento do tom da franquia permeia por toda a obra, que falha até mesmo no humor. O humor e o terror, de certa forma, possuem uma afinidade natural na linguagem. Há a criação de expectativa no quadro – a armação de sua situação (o set-up), e a entrega – a “reviravolta (punchline)”. Ambos não funcionam, já que a obviedade de suas situações começa no roteiro e é estendida na direção nada criativa de Robitel, que entrega todos os sustos de antemão. Se a brincadeira com a expectativa de seu público é um dos elementos mais prazerosos do terror, é uma pena vê-la sendo desperdiçada na misé en scene mal arquitetada e jumpscares previsíveis.
Essa expectativa frustrada acaba definindo Sobrenatual: A Última Chave, que só é salvo pelo carisma de sua protagonista, a médium Elise vivida por Lin Shaye – e até mesmo ela chega a atingir níveis exagerados que evidenciam uma clara falta de direção. É necessária uma correção de curso. É uma pena ver uma série de filmes com ideias tão interessantes ser renegada ao mero “terror da semana”. Elise merecia mais.