Das Letras para o Cinema
As relações entre o cinema e a literatura são complexas e se caracterizam, sobretudo, pela intertextualidade, ao ser realizadas adaptações para o cinema que vão dos contos infantis, aos clássicos literários e contos infanto-juvenis. O texto literário, por vezes, tem dificuldade de encontrar leitores, o texto em filme aparece como texto rico e plural, capaz de conjugar várias linguagens, atraindo grande parte do público.
As crianças estão expostas desde pequenas a diversas maneiras de comunicação e interação humana. Atualmente, estão em seu dia a dia em contato com a televisão, com o computador, videogame, filmes e desenhos animados. Começam, desde cedo, a ler imagens, sons, gestos, cores que se misturam, surgindo e desaparecendo muito rápido da frente de seus olhos.
Configura como consenso entre os especialistas que o Brasil não está formando leitores eficazes, apenas indivíduos alfabetizados, capazes de decodificar um conjunto de letras e depreender delas um significado literal, muitas vezes incapazes de atingir o nível da compreensão leitora.
Mas ler requer esforço, tempo e motivação, razão para muitas dificuldades encontradas, visto que não há um “tempo disponível” no mundo tecnológico e imediatista, para afazeres simples como sentar em um lugar confortável e abrir um livro.
Nesse sentido, o filme se apresenta como texto ímpar para leitura e análise, uma vez que congrega a linguagem verbal, visual e sonora como é a grande parte da leitura a que os alunos estão expostos como internet, filmes, desenhos animados, videogame. Essa interação com as novas linguagens pode ser a porta de entrada para o mundo da leitura na sala de aula, inclusive na descoberta de como crianças e jovens têm construído suas representações sobre a realidade em que vivem.
Nesse contexto, destacam-se as produções da cinematográficas de contos infantis e literatura infanto-juvenis que, estruturalmente, associam-se às formas narrativas e a antiga tradição de contar e ouvir histórias. Vê-se que no princípio, a ideia era perpetuar tradições e rituais, transmitindo conhecimentos através das adaptações literárias. Entretanto, com o passar do tempo, a função social das histórias no cinema alterou-se e, hoje, elas possuem, também, o caráter de diversão, reflexão, de mostrar “a vida como ela é” e, indo em direção a um tipo de entretenimento massificado.
Todo mundo tem um filme que marcou a infância. Seja pelas personagens divertidas, pelas aventuras cheias de reviravoltas ou pelos cenários de sonho, esses filmes se tornaram clássicos por encantarem gerações – e marcarem para sempre a infância como um momento tão mágico e especial. Os estreitos laços entre a produção cinematográfica e a literatura infantil remontam ao início da transformação que passou a indústria do cinema, com a animações e produções de Walt Disney.
São muitos os autores que ressaltam as diferenças entre o cinema e a literatura, eternas as discussões sobre o que separa uma arte da outra. Talvez menos seja dito sobre as semelhanças entre elas, sobre aquilo que as une e que proporciona a adaptação cinematográfica como tal.
O cinema e a literatura podem ser analisados como duas “linguagens” diferentes, entendendo-se a linguagem como um sistema de códigos que permite a transmissão de informação. O cinema é um sistema de códigos audiovisuais; a literatura um sistema de códigos baseado no alfabeto gráfico.
O cinema e a literatura funcionam de modo similar no que se refere à estruturação de narrativas. Pode-se contar uma história com palavras ou com imagens, ou mesmo passar de uma para a outra: por exemplo, o cineasta pode pensar pela primeira vez no argumento do seu filme com uma série de imagens na sua mente; depois elas são transformadas em palavras (o roteiro), que viram novamente imagens (o filme), e quando alguém assiste ao filme e conta para outra pessoa, as imagens viram novamente palavras. Assim, a adaptação de uma história de um meio a outro ocorre justamente devido as características da estrutura ficcional.
É por isso que uma mesma narrativa ficcional – digamos Chapeuzinho Vermelho – pode ser contada em vários meios diversos ou transportada de um meio a outro sem por isso perder as características básicas, que a identificam como a mesma história.
Partindo desse pressuposto, o fato de que um romance ou fábula ou conto de fadas seja escrito com palavra não quer dizer que ele não possa ser também uma obra visual, pois todas as artes devem apelar aos sentidos, e que um bom narrador não deve apenas narrar, mas mostrar e fazer o leitor ver. Ao lermos um livro, ou contarmos uma história fazemos uma representação mental daquilo que é narrado. Imaginamos a personagem descrita, o ambiente que ela se move, suas ações. De algum modo vemos a personagem ainda que não tenha contornos definidos, apenas seja uma ideia vaga na nossa mente, baseada em imagens prévias.
O cinema dá concretude a essa imagem mental dando concretude ao transformar o que na literatura é vago e diverso, para cada leitor, em uma imagem concreta e igual para todos. Acredita-se que as adaptações são, muitas vezes, responsáveis pelo crescimento da venda de livros.
Os próprios jovens reconhecem que os filmes incentivam a leitura dos livros. Muitas vezes os ouvimos dizer que acreditam na influência de leitura a partir de filmes e da curiosidade que despertam, e que gostam de comparar suas diferenças para ver “em qual suporte a história se encaixa melhor”. Além disso, eles gostam de ver o que imaginaram, ou de, ao ler após ver o filme, relembrar o que foi visto, criando novas imagens na mente a partir do que pôde ver no filme.
Adaptações cinematográficas de livros não são novidade. No entanto, nos últimos anos, elas têm “invadido” os cinemas, atraindo um grande número de espectadores. Definitivamente, Hollywood tem investido “pesado” nessas produções. Afinal, é um investimento com retorno praticamente garantido: o dos fãs dos livros.
Transpor clássicos da literatura para o cinema requer criatividade e desprendimento. Ao ler um livro, a mente do leitor cria uma imagem vaga, apenas insinuada. Já em uma versão cinematográfica, a adaptação para o novo meio substitui as palavras por imagens, em um processo que depende do autor do roteiro, da visão do diretor e do elenco e equipe técnica. Mais ainda, costuma exigir altos investimentos e apelo popular.
Mesmo que as adaptações de grandes títulos da literatura não substituam a leitura dos livros, ver os personagens de clássicos nas telas do cinema ou da TV pode motivar os estudantes a retornar aos textos com outra visão da narrativa.