Crítica | Amityville: O Despertar
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Crítica | Amityville: O Despertar

Amityville: O Despertar tropeça em seu próprio legado

Ficha técnica:

Direção: Franck Khalfoun
Roteiro: Franck Khalfoun
Elenco: Jennifer Jason Leigh, Cameron Monaghan, Bella Thorne, Jennifer Morrison, Mckenna Grace, Thomas Mann,  Kurtwood Smith
Nacionalidade e lançamento: EUA, 2017 (14 de setembro de 2017)

Sinopse: O longa é um renascimento de uma franquia popular, que concilia um tom moderno com o clássico gênero de terror. No filme, Belle (Bella Thorne) e sua família se mudam para uma nova casa, mas quando fenômenos estranhos começam a ocorrer, Belle começa a suspeitar que sua mãe não está contando tudo e logo percebe que eles simplesmente se mudaram para a infame casa de Amityville.

Os horrores da vida real nunca falharam em inspirar obras cinematográficas que se transformam em verdadeiras franquias. Um destes horrores mais famosos é o do caso Amityville, que rendeu inúmeras produções para o cinema e mercado home & video, desde o mais popular Horror em Amityville de 1979 estrelado por James Brolin e Margot Kidder, passando pelo remake de 2005 protagonizado por Ryan Reynolds e chegando aos mais recentes e risíveis “filmes” direto para DVD/BD/VOD com subtítulos genéricos como “A Nova Geração (e qualquer franquia de terror que se renda a esse tipo de subtítulo merece desde já alguns anos de esquecimento)”.

E então temos este Amityville: O Despertar, que tem a intenção de servir, ao mesmo tempo, como uma espécie de reboot e remake do original, incluindo elementos metalinguísticos como a citação aos outros filmes da franquia. No terror, que segue a cartilha dos filmes de casa assombrada (o que não seria um problema se o diretor Franck Khalfoun – que já se provou eficiente em outros filmes de horror – soubesse trabalhar dentro disso), a jovem Belle (Bella Thorne) se muda para uma nova casa com sua mãe Joan (Jennifer Jason Leigh), sua irmã Juliet (Mckenna Grace) e seu irmão James (Cameron Monaghan), debilitado por causa de uma doença degenerativa. Quando fenômenos estranhos envolvendo seu irmão começam a ocorrer, Belle começa a suspeitar que sua mãe não está contando tudo e logo percebe que eles simplesmente se mudaram para a infame casa de Amityville.

Amityville: O Despertar

Os irmãos Belle (Bella Thorne) e James (Cameron Monaghan) em “Amityville: O Despertar”

A verdade é que a história de sua complicada produção pode ser até mais interessante do que o filme em si. Originalmente chamado Amityville: The Lost Tapes, o filme contaria com a estética de found footage e seria dirigido pelo mesmo Khalfoun que assina O Despertar. Após algum tempo, porém, esta abordagem – utilizada à exaustão e sem inventividade pela indústria nos últimos anos – foi abandonada e deu espaço para uma narrativa mais convencional de casa assombrada. Filmado em 2014, Amityville – O Despertar teve sua estreia marcada para 2015, um lançamento que nunca se concretizou. O filme passou por diversos cortes, trocas de estúdios e refilmagens em 2016, e não foi lançado nos Estados Unidos até hoje. Onde foi lançado: em alguns países como Ucrânia, Argentina e nas nossas terras tupiniquins.

Toda esta turbulência durante sua produção reflete apenas a bagunça que Amityville – O Despertar  é (a ponto de garantir o seu não-lançamento lá fora),  falhando fundamentalmente como filme de terror, agradando pontualmente como uma trasheira não intencional do gênero, e se tornando interessante apenas quando tenta prestar, de alguma forma, algum tipo de reverência metalinguística ao “legado” deixado por seus antecessores. Essa metalinguagem parece muito mais interessante ou perspicaz do que realmente é. E com certeza não é uma ideia nova: utilizada há quase 25 anos pelo mestre Wes Craven em seu subestimado A Hora do Pesadelo 7: O Novo Pesadelo, com quebras da quarta parede que não só tratavam os filmes anteriores como meros “faz de conta” naquele universo mas continham os atores daqueles filmes interpretando eles mesmos, essa linguagem seria eventualmente aprimorada nos filmes da série Pânico, também idealizados por Craven.

Amityville: O Despertar

Belle ( Bella Thorne), Joan (Jennifer Jason Leigh) e Juliet (Mckenna Grace) em “Amityville: O Despertar”

Se em tais obras a metalinguagem é utilizada para fazer um comentário sobre o gênero, um verdadeiro exploitation,  O Despertar parece acreditar que utilizando essa linguagem ele se desprenderá dos Amityville anteriores de alguma forma, como se a simples quebra da quarta parede o colocasse num patamar acima daquelas produções, para que o filme pareça mais esperto do que realmente é. Assim, temos apenas citações aos filmes anteriores que não vão a lugar nenhum, e desperdiçam uma ideia que seria potencialmente interessante nas mãos de escritores mais talentosos.

Possuindo um certo amadorismo, seja nas composições de planos ou no uso de computação gráfica, fica claro o medo dos produtores em relação a esta obra, que por vezes não parece um filme totalmente finalizado. Há um certo charme em efeitos levemente precários, evidenciando as raízes independentes que o terror tanto abraça. No entanto, enquanto as melhores obras do gênero sabem quando utilizar o baixo orçamento a seu favor, descobrindo sempre maneiras criativas para provocar o medo através de sombras e insinuações, aqui o dinheiro é utilizado da pior forma possível, investindo em efeitos computadorizados mesmo com o orçamento baixo, o que apenas enfatiza a falta de visão criativa e, sinceramente, rende algumas imagens cômicas e ridículas de tão precárias em seu acabamento visual (e isto pode ser bom ou ruim, de acordo com os gostos excêntricos do cinéfilo de terror que pode gostar desta trasheira não intencional). Uma sequência em especial, envolvendo moscas computadorizadas e o médico vivido por Kurtwood Smith é hilária.

Amityville

“Amityville: O Despertar” chega aos cinemas no dia 14/09

As atuações são, como o resto dos valores de produção, precárias em sua maioria. Bella Thorne (a garota prodígio do Disney Channel) não consegue convencer nem mesmo como a scream girl da vez. A veterana Jennifer Jason Leigh possui sempre uma presença intimidadora em tela, mas entrega uma interpretação desinteressada. Cameron Monaghan, um dos destaques na série de tv Gotham, evidencia porque é tão eficaz naquela série: ela abraça atores canastrões que funcionam naquela realidade estilizada, e não num mundo onde as pessoas agem como…bom, pessoas. A pequena Mckenna Grace faz o necessário como a garotinha loira que conversa com espíritos ao passo que Jennifer Morrison está totalmente perdida.

Com um roteiro problemático que envolve muitas sequências de sonhos, e uma fotografia com excesso de soft focus, Amityville: O Despertar parece a todo momento querer prestar algum tipo de serviço ao próprio legado. Se a casa idêntica aos originais (e a verdadeira) é um agrado aos fãs de terror, ao passo que algumas ideias poderiam funcionar dentro do absurdismo deste gênero (a relação dos irmãos, James como receptáculo, e até o twist absurdo do ponto de vista lógico envolvendo Joan), o diretor Franck Khalfoun desperdiça tudo isso num filme que é claramente uma vítima de sua turbulenta gestação.

Amityville

Irmãs de Sangue: Belle (Bella Thorne) e Juliet (Mckenna Grace) em “Amityville: O Despertar”

Em determinado momento deste filmecerto personagem diz, num vergonhoso tom de falsa autoconsciência: “os filmes de terror deveriam apenas divertir e servir como escapismo”. Tal momento só evidencia os problemas desta obra, que, apesar de algumas ideias interessantes (e potenciais momentos trash não intencionais que agradam os fãs do gênero), falha como comentário metalinguístico, produção de genuíno terror ou como simples diversão que, ao contrário do que os realizadores deste filme tentam dizer, através de seu personagem raso, Amityville: O Despertar não é.


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Resumo

Com um roteiro problemático que envolve muitas sequências de sonhos, e uma fotografia com excesso de soft focus, Amityville: O Despertar parece a todo momento querer prestar algum tipo de serviço ao próprio legado. Se a casa idêntica aos originais (e a verdadeira) é um agrado aos fãs de terror, ao passo que algumas ideias poderiam funcionar dentro do absurdismo deste gênero (a relação dos irmãos, James como receptáculo, e até o twist absurdo do ponto de vista lógico envolvendo Joan), o diretor Franck Khalfoun desperdiça tudo isso num filme que é claramente uma vítima de sua turbulenta gestação.

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