Crítica: O Círculo (The Circle, 2017)
O Círculo tinha muito potencial e praticamente todo ele foi desperdiçado.
Ficha técnica:
Direção e roteiro: James Ponsoldt
Elenco: Emma Watson, Tom Hanks, John Boyega, Ellar Coltrane.
Nacionalidade e lançamento: EUA e Emirados Árabes, 2017 (22 de junho de 2017 no Brasil)
Sinopse: The Circle é uma das empresas mais poderosas do planeta. Atuando no ramo da Internet, é responsável por conectar os e-mails dos usuários com suas atividades diárias, suas compras e outros detalhes de suas vidas privadas. Ao ser contratada, Mae Holland (Emma Watson) fica muito empolgada com possibilidade de estar perto das pessoas mais poderosas do mundo, mas logo ela percebe que seu papel lá dentro é muito diferente do que imaginava.
Imagine uma premissa que misture Show de Vida de Truman com um episódio de Black Mirror. Acrescente um elenco que conta com Ellar Coltrane (o menino de Boyhood), John Boyega (o carismático Finn de Star Wars), Emma Watson (A Bela e a Hermione), além do super astro Tom Hanks. Pra fechar, tempere com uma crítica ao futuro cada vez mais presente que viveremos/vimemos, em um mundo onde os aplicativos nos dominam e a privacidade tende a diminuir.
Um filme com tudo isso tinha que dar certo, não é mesmo? Infelizmente quase tudo dá errado…. O roteiro mal escrito é ainda mais afundado por uma montagem desastrosa e uma direção sem pulso. Os grande problemas propostos são resolvidos com uma simplicidade pífia. Os temas podem gerar discussões pós-filme, mas mais por urgência do assunto do que por mérito cinematográfico.
A nossa protagonista Mae (Watson) vai trabalhar em uma empresa que é um combo de referências à cultura pop-tecnológica. O símbolo de O Círculo lembra o Uber. As apresentações do personagem do Tom Hanks, o visionário Bailey, tem um quê de Steve Jobs. O ambiente da empresa é o que o Google costuma vender para os funcionários. Com momentos que trazem funcionalidades de facebook, youtube e twitter, a proposta é clara: como o estilo de vida de muitos hoje em dia pode melhorar a captação de dados e compartilhamento das informações ao troco da perda da privacidade? Privacidade que é vista como algo negativo e até criminoso dentro da lógica do Círculo.
Em suma: a coisa poderia ser interessante. Muito. Falar em mundo futurístico é inocência. Parte dos acontecimentos já são cotidianos. Então a proposta de filme-denúncia tinha um caminho aberto para atingir um público ávido por redes sociais e monitoramento constante. Contudo, o filme falha na construção dos conflitos e no desenvolvimento dos personagens. E peca também em uma total ausência de sutileza.
Os exemplos são vários: um momento capital após uma apresentação, há um corte temporal de três dias que deixa de mostrar as consequências imediatas daquela situação – em um recurso que . Os personagens claramente, tem uma função importante, todavia os atos deles são ou minimizados ou simplesmente sem função narrativa. Um ranking de popularidade dentro do Círculo é uma ferramenta que poderia ser explorada e foi jogada fora. Ou ainda frases como: “você não vai acreditar no que ele fez!” (e o fato em si não nos é mostrado…).
A transição dos personagens não é nada orgânica. Parece que muita coisa foi cortada do material final. A ascensão de uns e queda de outros tá ali…e nem pode-se alegar uma melhor dinâmica. Duas cenas em especial são muito mais demoradas do que precisava. Uma das é quando dois funcionários abordam a recém-chegada Mae e eles a questionam sobre o viés social. O temas são tão mal distribuídos que o tempo todo está acontecendo algo, mas há uma constante sensação de que nada acontece. Acaba que temos questões relevantes abordadas de um jeito até tolo e muito maniqueísta. Os dilemas morais propostos são rasos.
Os atores não tem muito o que fazer. O texto não ajuda e a evolução dos personagens tampouco. A carga mais pesada, exigida da Emma Watson, é entregue apenas com caracteres básicos. Os rompantes de triunfo, tristeza, alegria ou confusão ficam no básico. Boyega tem o mérito de não fazer lembrar o personagem que vive em Star Wars, mas o demérito de ficar sombra dele mesmo. Hanks praticamente fala o texto, com pouca emoção.
O ponto positivo fica por conta de como as tecnologias são mostradas. Como enxergamos através de tela sobre tela, o visual poderia soar fake, mas nesse quesito a coisa flui bem. A locação escolhida também condiz com a proposta e as linhas internas do prédio principal tem um bom misto de dureza e calor, não fica com aquela marca cinza “futurista” opaca e robótica.
Mas é pouco para salvar O Círculo. O longa, pela proposta, elenco e potencial, pode ser definido como uma das grandes decepções do ano.