La La Land: motivos para amar mesmo odiando musicais
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La La Land: motivos para amar mesmo odiando musicais

Se você está acompanhando a temporada de premiações um filme tem sido recorrente nas cabeças: La La Land. Por exemplo, com 7 prêmios no Globo de Ouro é o maior vencedor da história daquela competição. E se você é como eu e odeia musicais, então tem um problema pela frente: como encarar um dos possíveis favoritos à principal estatueta do ano?

Simples, o mérito aqui vai além de ser um excelente filme com canções e dancinhas. Há muitos, mas muitos destaques. Favorito ao Oscar, junto com Moonlight e Manchester à Beira Mar, e provável candidato em várias categorias. O que faz La La Land ser tão especial? Quem gosta de musicais sabe a resposta na ponta da língua, mas que tal analisarmos o filme para além desse fator?

A DIREÇÃO DE DAMIEN CHAZELLE

Na primeira cena, o jovem diretor mostra um gigantesco plano sequência. E com ele vemos a capacidade e a consciência da câmera que tem em mãos. O número musical (irritante para os detratores do gênero) se torna algo mágico cinematograficamente. E não para por ali. Tal recurso, deixar a câmera filmando, é utilizado mais vezes em maior ou menor grau. Essa difícil  fluidez permite um envolvimento por parte do público. Reparem na cena da piscina e deixem ser embalados por aqueles movimentos.

Como maestro de todos os elementos o resultado também é diferenciado. A harmonia e precisão estética assustam. Chazelle vem como um dos favoritos ao segundo mais esperado prêmio da festa da Academia.

FOTOGRAFIA, FIGURO E DIREÇÃO DE ARTE

Um dos aspectos mais belos em La La Land é o jeito como a cor é trabalhada. Muitos dos tons vistos em tela são provenientes de elementos diegéticos, ou seja, um abajur, uma casa, o Sol… por falar em Sol, há um momento em especial que o plano de fundo é a linha do horizonte ao amanhecer e temos um roxo/avermelhado/alaranjado artificialmente natural. E mesmo a escuridão é bem utilizada e reflete um sentimento pertinente naqueles momentos.

As roupas encantam e são pluri coloridas. A nossa protagonista, Mia (Emma Stone), sempre traz uma novidade na vestimenta. O grupo de amigas, cada um com uma cor diferente no vestido, gera um mini arco-íris e só com o movimento das roupas já é um afago visual quase psicodélico. E não só: objetos, prédios, carros, tudo confluindo para a narrativa e para nos apaixonarmos.

ATUAÇÕES (Ryan Gosling, Emma Stone, J.K. Simmons)

Mesmo sem serem exímios cantores e dançarinos Ryan Gosling e Emma Stone, entregam um serviço bem feito. A química entre eles é tão forte que superamos a falta de brilhantismo. A dupla premiada no Globo de Ouro na categoria comédia e musical não deve ter chances reais no Oscar, mas recebeu aquele prêmio de forma justa. Algo impressiona: ele tem quase sempre a mesma expressão (a cara de cachorro perdido) e ela, ao contrário, é muito expressiva. Essa combinação resultou em uma improvável verdade. O público se importa com eles e torce por eles.

Não posso deixar de destacar J.K. Simmons, vencedor do Oscar de Melhor Ator Coadjuvante sob a batuta de Chazelle há dois anos por Whiplash. O consagrado ator faz basicamente uma ponta, aparecendo em duas cenas, mas ainda assim é memorável – seria o equivalente à Michelle Williams em Manchester à Beira Mar. Claramente ele se diverte e diverte quem está assistindo.

O SILÊNCIO E AS MÚSICAS

Como vou elogiar as músicas se o título é justamente: “La La Land: motivos para amar mesmo odiando musicais”? Uma das principais críticas aos musicais são as conversas banais que se transformam em grandes apresentações e tiram a naturalidade e imersão da trama. Aqui há sim momentos nesse estilo mais clássico, contudo vemos também cantorias orgânicas. Principalmente na figura do Ryan Gosling, já que Sebastian é um tecladista. Então nem sempre a história precisa parar para a música aparecer, a música é um elemento narrativo aqui.

Em um filme tão verborrágico o silêncio é arma poderosa. Há duas cenas, uma em um jantar e outra no final, que o notamos mais forte. Sabiamente pontuados e precisamente encaixados, tal “som” quebra perfeitamente o tom, quem gosta de carnaval sabe o efeito de uma boa paradinha na bateria.

[vale tirar o bode da sala: ao contrário do que muitos pensam este musical não é 100% cantado. Isso facilita a vida de quem não aprecia os números musicais]

PARA ALÉM DO LA LA LA: O ROMANCE E O SUBTEXTO

Muitos não consideram musical como um gênero. Pensando assim podemos definir La La Land como uma comédia romântica. O humor do filme funciona tanto visualmente, quanto textualmente. As referências e diálogos estão recheados de ironia, leveza e motivos para gargalhar. Mas o romance é centro aqui. Tudo iria por água abaixo se não acreditássemos naquele casal. O arco deles é bem fechadinho e apesar de montar no clichê, há uma certa vírgula que vai além.

Outro ponto focal são as discussões sobre o fazer artístico. O quanto a coisa deve ser mecânica e funcional e o quanto inspiradora e gratificante? Vale lutar pelos sonhos ou a vida é pragmática demais para esses devaneios? O jeito que o La La Land trabalha essas questões torna a experiência menos vazia que outros colegas do (sub)gênero.



Enfim, gostando ou não de musicais La La Land é um belo produto cinematográfico. Meus filmes favoritos de 2016 ainda são A Chegada e A Criada, contudo se este ode ao cinema clássico vencer o Oscar também aplaudirei. Parabéns aos envolvidos por terem feito derreter o coração gelado deste espectador ranzinza.

Confira também a crítica do Daniel Cury sobre La La Land

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