Crítica: Sing Street
Sing Street é um filme coming of age que consegue unir simplicidade e muita música de um jeito muito irlandês
Ficha técnica:
Direção e Roteiro: John Carney
Elenco: Feria Walsh-Peelo, Lucy Boynton, Maria Doyle Kennedy, Jack Reynor, Percy Chamburuka , Aidan Gillen, Ian Kenny, Ben Carolan, Mark McKenna.
Nacionalidade e lançamento: Irlanda/Reino Unido/ Estados Unidos, 17 de Março de 2016 (Irlanda)
Sinopse: Na Dublin de 1985, Conor (Ferdia Walsh-Peelo) é um jovem de 14 anos obrigado a mudar de escola devido à difícil condição financeira de seus pais, que também estão com o casamento em crise. Diante das dificuldades, Conor conhece Raphina (Lucy Boynton), e decide montar uma banda de rock para impressioná-la, sem saber que isso teria um impacto muito maior em sua vida.
Foi por indicação do Will Bongiolo que descobri que o mais novo filme de John Carney já estava disponível na Netflix. Indicado ao Globo de Ouro na categoria “Melhor Filme – Comédia ou Musical”, o longa muito além disso da comédia. Escrito e dirigido por Carney, tal qual seus filmes “irmãos” “Apenas Uma Vez” e “Mesmo Se Nada Der Certo” (todos excelentes e infelizmente já defenestrados do catálogo do serviço de streaming), o longa nos leva às descobertas e desafios adolescentes do jovem Conor, que decide criar uma banda apenas para conquistar a bela Raphina.
É interessante notar a eficiência das primeiras cenas do longa. Em pouquíssimos minutos já conseguimos compreender tudo o que se passa na vida de Conor: o ano é 1985, a Irlanda vive uma crise que faz muitos jovens emigrarem para o Reino Unido, e que só não é maior que a crise no casamento dos pais do protagonista. Em seguida, já descobrimos que os tempos são difíceis e o jovem terá que mudar de escola.
A partir daí, Carney dá sequência a uma história que combina com seus trabalhos anteriores: sem grandes alardes, mostra com sensibilidade uma jornada de autodescoberta e crescimento por meio da música. Desde o princípio, Conor é mostrado como um menino sonhador e sensível, mas que não cede facilmente ao bullying que é obrigado a encarar na escola.
Os méritos do filmes são muitos, fazendo-o ser o mais maduro que os antecessores do diretor irlandês. Ele conta com diversos momentos engraçados – muitos protagonizados por Brendan, vivido por Jack Reynor, uma espécie de Seth Rogen mais jovem e com sotaque irlandês – e ainda mostra o desenvolvimento da banda de forma orgânica. Em determinado momento, quando a curiosa banda já está formada e ensaiando, os membros são apresentados gradativamente, com cada instrumento surgindo na música conforme eles aparecem diante da câmera, que gira no centro da sala, comprovando o posicionamento do diretor como alguém que conecta imagem e som em sincronia, o que cria uma rima temática com um diálogo no início do filme.
E em um ano em que a série “Stranger Things” fez tanto sucesso, “Sing Street” consegue criar uma ambientação dos anos 80 até mais eficiente que a série, especialmente por causa da música, que funciona como fio condutor de toda a trama – e a forma como a banda faz seus vídeos é não apenas uma homenagem ao videoclipe como um dos símbolos dos anos 80, como também forma uma interessante metalinguagem. É uma pena, portanto, que o longa se destine a tridimensionalizar apenas dois ou três integrantes da banda, fazendo dos outros apenas figurantes.
Como comentário da sociedade, “Sing Street” também funciona muito bem, não só criticando a ausência dos pais na vida dos filhos, como a sociedade católica e conservadora presente na figura dos professores. É interessante ver que, em dois momentos, o filme flerta muito sutilmente com a discussão sobre o abuso sexual, tanto na cena em que o diretor da escola oferece seu banheiro a Conor, quanto no momento em que Raphina fala sobre seu pai. E seria injusto não citar o problemático Barry, cuja trajetória permite compreender (mas não aceitar) os motivos para ser o “bullie” da escola, e até mesmo o perdão que os personagens têm por ele.
Por fim, “Sing Street” consegue ser sensível e passar longe da pieguice ao mostrar a luta de um adolescente para encontrar seu lugar, e a cena em que o jovem “sonha acordado” e se imagina tocando em uma festa consegue mostrar muito bem como ele se sente. Há filmes da categoria “coming of age” muito melhores, mas ainda assim este consegue trazer à luz uma jornada interessante, e ainda revive canções de uma época importantíssima para a música.
Resumo
Como comentário da sociedade, “Sing Street” também funciona muito bem, não só criticando a ausência dos pais na vida dos filhos, como a sociedade católica e conservadora presente na figura dos professores. A cena em que o jovem “sonha acordado” e se imagina tocando em uma festa consegue mostrar muito bem como ele se sente.