Crítica: Quando as Luzes se Apagam
Quando As Luzes Se Apagam pega um conceito interessante mas não o explora adequadamente.
Ficha técnica:
Direção: David F. Sandberg
Roteiro: Eric Heisserer
Elenco: Teresa Palmer, Maria Bello, Gabriel Bateman, Billy Burke, Alexander DiPersia.
Nacionalidade e lançamento: EUA, 2016 (18 de agosto de 2016 no Brasil)
Sinopse: Quando Rebecca saiu de casa, ela pensou que deixaria seus medos de infância para trás. Enquanto crescia, ela nunca teve realmente certeza do que era e não era real quando as luzes se apagavam… Agora é seu irmão mais novo, Martin, que está enfrentando os mesmos eventos inexplicáveis e aterrorizantes que antes testaram a sanidade e ameaçaram a segurança dela. Uma entidade assustadora com uma ligação misteriosa com sua mãe, Sophie, ressurgiu. Mas desta vez, como Rebecca se aproxima da verdade, não há como negar que a vida de todos eles está em perigo… quando as luzes se apagam.
Quando As Luzes se Apagam é um filme curioso. Dirigido pelo estreante David F. Sandberg, a obra é baseado no curta Lights Out, também dirigido por Sandberg. O curta, que foi lançado em 2013, ganhou alguns concursos no cenário do horror independente e chamou a atenção de todos por ser bem produzido para um projeto de baixo orçamento, e por demonstrar, com seus jogos de câmera e a forma com que “brincava” com as expectativas do espectador, que o diretor era um talento promissor e merecia atenção. E Sandberg conseguiu essa atenção, mais precisamente da Warner Brothers Pictures e de James Wan, diretor que vem há alguns anos injetando fôlego em um gênero tão desgastado: o de terror.
A influência de James Wan
O curta original tinha um enredo simples, mas executado de forma excepcional: uma mulher é “confrontada” por uma força maligna que só aparece…bem, quando as luzes se apagam. Enquanto ela tenta manter as luzes acesas, essa entidade quer o contrário. Sandberg fazia um bom uso de ângulos e jogos de câmera, construindo em poucos minutos um surpreendente clima de tensão, e explorando de forma inventiva um dos medos universais do ser humano: o medo do escuro. Warner e Wan enxergaram no cineasta um novo talento, uma boa ideia e o mais importante: um sucesso comercial em potencial.
E esta é a palavra da vez: potencial. Ou o desperdício dele. Parte do sucesso do curta original se devia ao fato de ele ter surgido do nada e ter pego todo mundo de surpresa. De ser misterioso. A entidade/criatura não era explicada (nem havia tempo para isso). Era só uma situação de tensão envolvendo o medo e pavor do desconhecido. E é por isso que a sequência inicial deste Quando As Luzes Se Apagam é a melhor de todo o filme e funciona melhor até que o curta original. Além de ser uma espécie de remake do curta (alguns planos são replicados aqui), a boa fotografia, sonoplastia e efeitos especiais parecem apontar logo de cara que Sandberg é uma boa aposta. A decepção vem então, quando esperamos que as expectativas criadas pelo ótimo prólogo se concretizem, mas ao invés disso presenciamos uma história que não foge muito do cliché de “família assombrada”, com direito a “garotinha com cabelos pretos cobrindo o rosto” da vez.
Na história, Teresa Palmer vive Rebecca, uma jovem confusa com problemas do passado envolvendo uma entidade chamada Diana. A figura parece ter um apego especial com a mãe de Rebecca, Sophie (Maria Bello). Quando seu irmão mais novo, Martin (Gabriel Bateman), começa a presenciar as mesmas assombrações, Cabe a Rebecca e seu namorado Bret (Alexander DiPersia) desvendarem o mistério por trás dos eventos. As atuações são até competentes, com o destaque esperado para Maria Bello como Sophie, mas o pequeno Martin de Gabriel Bateman é instável e aborrecido como personagem, e não de forma crível ou positiva. A “atuação” de Bateman se resume a expressões nada convincentes de horror, e Martin tem sua personalidade alterada de acordo com as conveniências do fraco e genérico roteiro de Heric Heisserer.
O clássico vs. o cliché
É aí que percebemos a diferença essencial de um James Wan com um David F. Sandberg. A comparação é injusta, mas impossível de não ser feita, com o bom Invocação do Mal 2 de Wan ainda recente na memória. Percebem-se muitas influências do diretor na construção da mise-en-scène, o que não é coincidência (James esteve presente no Set de filmagens para auxiliar Sandberg, provando que a inclusão de seu nome nos materiais de divulgação não são meros chamarizes). A diferença está na forma que ambos contam a história. Por mais formulaicos que os roteiros de Invocação do Mal 1 e 2 pareçam, o que os torna realmente especiais é a combinação de boas atuações (a sintonia de Patrick Wilson e Vera Farmiga fazia com que nos importássemos com o destino daqueles personagens), fotografia, design de som e até a direção de arte, que destacam aquelas obras da maioria dos filmes de terror. Os clichés do gênero, então, mesmo que presentes, eram (com o perdão do trocadilho) “exorcizados” de certa forma, eram revertidos num tom clássico de homenagem.
Em Quando As Luzes Se Apagam, no entanto, temos 15 minutos excelentes, que os 70 minutos seguintes (o filme só tem 1h 20 min) nunca superam. Apesar de bons momentos e ideias (a luz refletida dos tiros de uma arma fazendo Diana aparecer em flashes), a obra se rende a uma narrativa genérica de núcleo familiar (criatura que atormenta a família há décadas) e a diálogos expositivos do pior tipo (“Ele é meu padrasto, meu pai biológico fugiu quando eu tinha 10 anos”). Se o gênero de terror nos ensinou algo é que o desconhecido muitas vezes é mais assustador. E é nas pretensões de dar um nome e uma forma à entidade do filme, construindo uma mitologia que poderia ser até interessante se não fosse tão genérica, que o projeto desmorona.
Ao decorrer do filme, Sandberg vai se entregando cada vez mais às convenções do gênero (que podem ser boas ou ruins), apostando em sustos fáceis que assustam não por serem de natureza apavorante, e sim por se apoiarem em uma trilha sonora escandalosa que toma conta do filme sempre que ocorre alguma manifestação de Diana, tornando os momentos de sustos irritantes. Há algumas boas e criativas sequências no entanto, e uma em especial, em que um quarto é todo iluminado por uma luz neon falha de um estúdio de Tatuagem merece atenção pelo bom uso de sombra e luz. Mas nada que te salve dos outros momentos aborrecidos.
Há um problema maior ainda: se a entidade Diana é utilizada como um simbolismo que representaria a depressão de Sophie (Como no ótimo The Babadook), a solução encontrada por Heisserer e Sandberg para o fraco desfecho é perturbadora (de forma negativa) e até ofensiva.
Quando As Luzes Se Apagam pega um conceito interessante que não é explorado o suficiente. David F. Sandberg é um talento promissor, mas um amadurecimento de idéias é necessário quando se vai realizar um longa-metragem. As atuações são competentes (com exceção do pequeno e insuportável Bateman) e o visual é até interessante, quando se contenta com as silhuetas de Diana. Porém, assim como em Annabelle, o projeto serve mais para nos lembrar do quão melhores as obras dirigidas por James Wan são. O Mais novo terror produzido por Wan não é um desastre, mas poderia ser bem melhor. Alguns curtas permanecem neste formato por um motivo.