ROCHA)S( #18 – “Personal Vivator” e Os Olhares de um país colonial.
À primeira vista a premissa do curta metragem “PERSONAL VIVATOR” (2014) pode ser encarada como uma realidade surreal ou o prelúdio de futuro ainda muito distante. Mas se analisada por um olhar profundo e contextualizado na nossa contemporaneidade, vemos que o futuro parece mais perto do que nossos olhos terráqueos conseguem enxergar.
É por esse terceiro olho forasteiro, estranho e desconstruído, que a ficção-científica da cineasta carioca Sabrina Fidalgo (https://cinemacao.com/2015/08/10/a-mulher-negra-no-cinema-brasileiro-por-sabrina-fidalgo/) faz um recorte social do país e traça um diversificado mapa comportamental e controverso de seus habitantes.
A cena de abertura é sonoramente muda, mas a comunicação telepática e facial dos dois personagens intergaláticos ironiza o fascínio e a obsessão que nós brasileiros temos pelo que é de fora, e pelo “encantamento hospitaleiro” com quem chega de terras estrangeiras.
“Rutger” o extraterrestre protagonista (muito bem interpretado pelo ator Fabrício Boliveira, que consegue transparecer toda a estranheza que envolve o personagem), é a representação crua e desconstruída do olhar estrangeiro sobre o imaginário brasileiro.
O turista acorrentado por 72 horas a carcaça humana, a fim de pesquisar o comportamento humano, é negro, tem traços fortes e uma “identidade” similar à nossa, que até hoje ainda insistem em negar, subjugar e condicionar.
A necessidade de existir virtualmente é criticada, na cena em que “Rutger” enumera os pré-requisitos indispensáveis para a existência humana no século de hoje.
A casa virou o mundo virtual, o endereço o profile de cada uma das redes sociais existentes, e das que serão criadas num futuro próximo.
Em sua pesquisa documental o extraterrestre camuflado de cineasta, conhece a bem sucedida Anna e a empregada doméstica “Marineuza” (interpretadas pelas viscerais atrizes Ana Chagas e Ana Flavia Cavalcanti, respectivamente).
As personagens femininas ilustram dois lados do papel social da mulher. A primeira, o da mulher branca, independente profissionalmente, mas dependente de uma mão de obra feminina terceirizada que organize seu lar, realize os caprichos do seu marido e cuide dos seus filhos. A segunda, o da mulher negra, de classe social
inferior, que além de sofrer a pressão psicológica na casa da patroa, precisa cuidar do seu próprio filho, do marido e do lar.
“Marineuza”, a babá de mãe presente, se torna o reflexo social da patroa, ao contratar uma empregada doméstica para cuidar do que é seu, enquanto ela cuida do que é dos outros.
A tensão da última cena configura um reflexo trágico-realista da inversão comportamental do papel social da PATROA (que tem quem o faça) com a EMPREGADA (classe menos abastada que faz dobrado).
“Personal Vivator” é um filme de olhares (e reflexões).
O do protagonista intergalático converge com o da diretora, e ambos fazem com que o do público se dilate – em caráter de urgência – para encarar uma realidade que grita e é injusta.