Crítica: Trapaça
David O. Russel é um excelente diretor de atores. Depois de extrair grandes atuações de Christian Bale e Amy Adams no filme “O Vencedor”, em 2010, e depois de colocar as carreiras de Bradley Cooper e Jennifer Lawrence em ascensão após “O Lado Bom da Vida” em 2012, agora ele une todos eles em um único longa.
Em “Trapaça”, Irving (Bale) e Sydney (Adams) são golpistas que caem nas mãos do agente do FBI Richie DiMaso (Cooper), que os obriga a ajudá-lo no flagrante de políticos corruptos para que eles não precisem cumprir suas penas. Além deles, entram na situação o prefeito Carmine Polito (Jeremy Renner) e Rosaly (Lawrence), a esposa de Irving que definitivamente não está nas melhores condições mentais.
O diretor não subestima seu telespectador: vai e volta na trama, insere diálogos rápidos e dá seguimento aos acontecimentos sem explicar muitos pormenores. Ao mesmo tempo em que faz isso, David O. Russel se empolga com acontecimentos rocambolescos e até mesmo caricaturais (apenas alguns elementos são baseados em fatos reais), criando situações ora embaraçosas – à mesa com o mafioso -, ora desnecessárias – quando o prefeito surta em sua própria casa -, ora sexualmente tensas – graças à química de Cooper e Adams.
Visualmente, “Trapaça” é excelente. O figurino merece destaque graças aos seus elementos exagerados que não apenas lembram do período em que o filme se passa, como remetem ao exagero caricatural dos personagens (com exceção de Richie, que se veste de forma mais sóbria e representa o personagem mais sério). E se o “cabelo” (com aspas!) de Irving chama atenção pela forma desconexa, ele também conversa com as roupas do personagem, sempre tortas e descuidadas.
A direção de arte também tem elementos interessantes: a casa de Irving e Rosaly é apertada e devidamente condensada, mostrando que são personagens presos e sufocados; a casa de Richie é escura e mostra rapidamente o ambiente de tristeza (e pobreza) em que vive o personagem; a casa do prefeito Polito é ampla e padronizada, mostrando sua característica de “homem família” típico, e tudo é mostrado na melhor forma “anos 70”. A década da trama, aliás, fica devidamente estampada por meio da fotografia de tons sépia.
É uma pena que o filme não se aprofunde nos personagens. Apesar das cenas engraçadas, o ritmo ágil faz com que o espectador não encontre tempo para se afeiçoar aos trapaceiros e nem ao policial, muito menos à esposa doida. Apesar das atuações excelentes, falta alguma aproximação que permita ao espectador se importar com o fim dos personagens.
Curiosamente, no entanto, a busca pelo dinheiro e o final realista, que distorce os destinos entre o certo e o errado, formam uma conversa temática e temporal com “O Lobo de Wall Street“. Mesmo assim, “Trapaça” tem atuações memoráveis e uma trama apenas aceitável. Não merecia indicação ao Oscar de Melhor Filme… mas a Academia tem destas coisas.