Cinem(ação) na CCXP – Crítica: O Hobbit – A Batalha dos Cinco Exércitos
Comic Con, encerramentos e amor de fã.
Domingo. Quatro da manhã. Eu e meu amigo estamos no metrô em direção ao Centro de Convenções Imigrantes, em direção a Comic Con Experience, com um misto de sono, animação e receio. Tratava-se, enfim, de uma das Pré Estreias Mundiais de O Hobbit – A Batalha dos Cinco Exércitos. A tensão no transporte público era clara. Muitos fãs haviam dormido nas ruas para conseguir entrar na fila do possível maior evento nerd do ano. Como era muito cedo, não tinhamos as Vans da CCXP para nos levar até a porta da convenção. O jeito foi correr. ao chegar lá, a surpresa: A fila estava a kilômetros da convenção, atravessando a ponte do viaduto. O sonho de assistir a pré estreia do filme parecia chegar ao fim. Os 1000 lugares disponíveis no Auditório Thunder, o equivalente daqui ao Hall H da San Diego Comic Con pareciam ocupados. Continuamos na fila, então, sem a esperança de ver o filme e participar do evento. Fizemos algumas amizades na fila, como sempre ocorre na comic con, e continuamos por duas horas e meia ou mais nela. Até que, sem mais nem menos, um dos seguranças pede a todos que levantem as mãos e os ingressos e avisa que ainda têm 50 lugares do lado de dentro do Hall Thunder. A fila foi à loucura. Era empurrão de um lado, gritaria do outro, e, de alguma forma, eu e um grupo de pessoas fomos escolhidos. Meu amigo ficou por trás e não pode entrar. Lá dentro, a sensação era indescritível. Depois de três horas na fila, acordar cedo, correr no transporte público, e ter perdido todas as esperanças de ver o filme, eu iria não só entrar no Auditório Thunder como também assistiria ao filme com todos os fãs de Hobbit e a presença de Richard Armitage… A euforia foi tão imensurável que os nerds e fãs que não se conheciam começaram a se abraçar imediatamente, assim que conseguiram ser escolhidos numa fila de mais de 1.000 pessoas. Digamos que foi um começo de dia promissor.
Enfim no Auditório Thunder. Começo a abraçar as representantes da Warner e agradeço pelo evento. Meu lugar é indicado, gravo um ou dois audios no grupo do whatsapp notificando meus amigos do feito que consegui e me preparo para o filme, ainda sem palavras pela montanha russa de emoções que eu havia passado no evento até então e que culminava com este mega-evento da cultura pop, no último dia da tão sonhada Comic Con Experience. Richard Armitage aparece, criando um alvoroço dos fãs. O ator responde as questões do público e começamos o filme.
É aqui que devo deixar meu entusiasmo nerd e a felicidade do evento e de estar presenciando a obra num ambiente tão agradável de lado e analisar a obra com imparcialidade.
O que tenho a dizer sobre O Hobbit – A Batalha dos Cinco Exércitos é que, em primeiro lugar, sim, é o melhor filme da trilogia Hobbit. Em segundo lugar: isto não quer dizer que sua existência seja justificável, apesar de sua qualidade como entretenimento e a emoção que carrega por “finalizar uma história” por assim dizer. É isso que este terceiro Hobbit é: A conclusão de uma história que, vista isoladamente causa um tom de estranheza justamente por dar a sensação de ser a terceira parte de uma história, e não uma obra isolada completa. É como se alguém tivesse pego um filme completo e apenas nos tivesse mostrado a parte final do mesmo, já que ele começa, tem alguns momentos de história e mais da metade dele é composta de cenas de ação e guerra. Vertiginosa, sim, mas se justifica em si? Esta é a grande questão.
Não desmerecendo o filme, claro. As atuações, efeitos especiais, direção de arte… quase tudo impecável tecnicamente. O maior problema técnico mesmo é o fato de Peter Jackson usar o 3D como artifício e não como linguagem. O uso de Rack Focus por exemplo, é algo que o mesmo usa a exaustão e que contraria completamente a lógica do 3D, que envolve em grande parte ressaltar os planos, criando perspectiva e profundidade. A mudança brusca de foco anula este efeito, excluindo o uso do 3D. Porém o diretor se mostra mais eficiente com planos abertos, criando composições bonitas de encher os olhos.
Destaque na atuação aliás para ninguém menos que Richard Armintage, o Thorin. O dilema em que o mesmo se encontra e seus discursos são bons e sua trajetória é satisfatória e até emocionante. Martin Freeman, o Bilbo, tem menos destaque desta vez, mas não deixa de fazer um carismático hobbit e seus momentos de alivio cômico tornam o personagem ainda mais “amável”, e sua jornada, que envolve coragem e enfrentar seus medos é igualmente satisfatória.
Um dos motivos de discussão mais acalorados entre eu e meus amigos fãs de Hobbit era o fato de ser justificável a divisão do livro O Hobbit (que nunca li) em Três filmes. Muitas discussões aconteciam, mas a conclusão sempre chegada era a de que sim, é justificável. Após ver este terceiro capítulo, no entanto, devo admitir que os fãs irritados estavam, em parte certos. Por um lado, a obra é um grande espetáculo e você ri, fica tenso, se emociona com os discursos grandiloquentes de Thorin e até chega a chorar, pois aquela mitologia e personagens são tão queridos e carismáticos que você realmente quer que as coisas funcionem para eles. Há momentos em que tememos por algumas ações de certos personagens por sabermos o que os aguarda na Trilogia Senhor dos Anéis, o que causa uma certa aflição e verdadeira vontade de soltar um “não faz isso cara…eu sei isto vai terminar”. Por outro lado, é impossível, ao final, não sentir que faltou algo mais, de que há algo incompleto na experiência. Realmente o medo de que os outros dois filmes fossem arrastados justamente por causa do terceiro capítulo, para mim, se confirmou. Tanto que o terceiro é o que melhor flui. Nunca se sente o peso de suas duas horas e tantas, e é tudo bem dinâmico. Mas novamente, ao final fica-se a estranheza.
Talvez, no fim, o que Jackson tenha mesmo é tanto amor pelo universo de Tolkien e os personagens que habitam sua Terra Média que não consegue cortar o que precisa ser cortado de suas obras e deixá-las mais impecáveis. Talvez este terceiro filme só exista pela sua incapacidade de se desapegar deste universo. E, do ponto de vista dos fãs, não posso culpá-lo. É melhor terminar por cima, criando um legado admirável com obras contidas? sim, mas é como um diálogo no filme:
“Se isto é amor, eu não quero! Dói demais!”
“- Se dói, é porque foi real”
Isto resume de certa forma o sentimento de muitos em relação a esta trilogia, uma série de filmes que não se equiparam a primeira trilogia mas serve como uma carta de amor de Jackson a tudo que Tolkien criou, tudo que ele, e os fãs amam. Este terceiro filme existe mais, como uma difícil carta de despedida. E o diretor, apesar dos erros e equívocos parafraseia Thorin com a seguinte frase:
“Vocês me seguiriam uma última vez?”
E a resposta é sim, sr. Jackson.