"O Filho da Atriz": Bendito é o fruto ou o ventre?
Artigo

‘O Filho da Atriz’: Bendito é o fruto ou o ventre?

“CURTA METRAGEM BAIANO VENCE PRÊMIO DE MELHOR FILME

EM FESTIVAL DE CINEMA NO RIO DE JANEIRO”

– O filho não era meu, a atriz não era eu, mas me enchi de orgulho quando terminei a leitura dessa notícia.

Como baiano, como público sedento pelo novo, como ‘aspira’ a cineasta que sou e por sentir a ferroada na própria pele.

Realizar cinema no Brasil é uma tarefa herculana, principalmente quando o produto em questão é uma ovelha negra, dissidente do rebanho comercial em vigor (em duração e conteúdo), e quando não se pertence ao ‘mitiê’ da indústria.

Produzir curta metragem no Brasil é guerrilha. É ‘barril dobrado’!

 

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– O filho é do jornalista e cineasta baiano Juca Badaró, a atriz é Verena, e o palco desse nascimento foi o I Festival O Cubo de Cinema.

Na verdade, o filho era dela e a atriz era ela mesma, a mãe.

Em exatos 15 minutos e 41 segundos de película, ‘O Filho da Atriz’ coloca na boca de cena, Verena (Vivian Rigueira, densa e inteira), uma jovem atriz e Marco (Marcos Machado, despido de toda vaidade), um ator transformista.

Uma colisão dramatúrgica de gêneros, de gerações, mas acima de tudo de realidades entre o sonho de quem almeja ser e a realidade de quem se fode pra continuar sendo.

O sol borrado em neon e a pele branca, alva contrastam na tabula raso do ator.

Um prólogo em plano aberto inicia a narrativa.

O ator e seu papel duas vezes. A primeira COMO ATOR e a segunda DE ATOR.  Um que se camaleoniza, indo do mais poderoso gozo a mais profunda dor do parto; E o outro que se despe a cada descobrimento.

 

O Filho da Atriz 02

 

A nudez de Verena e seu contato direto com o mar, com a luz e com a terra – ainda que fofa e úmida da praia – simplesmente era um encontro dela consigo mesma. Não se trata meramente de um encontro casual, que temos ao olharmos no espelho. Não! Esse encontro quase nunca temos e não é marcado simplesmente pelo nosso próprio medo e livre arbítrio.

– Corte seco! 

O suspiro liberto dá lugar ao gemido da clausura. Metáfora do parir, das dores da gestação para o novo gerar de cada criação.

O palco, o ensaio, a criação, a gestação. Ciclos! (dos dois palcos)

No fixo e clássico, uma frase persiste.

 

“Você sabe quem eu sou?

Você sabe quem eu sou?”

 

FELIZ – (o prefixo é esse mesmo) o grande público não sabe. MENTE – (se todos soubessem qual seria a graça?)

Nem o próprio tem essa resposta em total certeza e convicção.

 

Livremente ‘esquartejei’ o filme em uma segunda parte. Essa deixa a subjetividade e os conflitos psicológicos nas areias da praia e assume um tom mais crítico.

A burocracia das leis de incentivo a cultura e a falta de credibilidade que o papel do ator tem para os ‘que incentivam’ e prestigiam (ou deveriam), é o desabafo que move Marco, um ator em pleno transformismo que vê o tempo passar e a carreira ir junto.

O importante discurso da personagem expõe os preconceitos e os rótulos que acompanham Téspis até os atores da contemporaneidade, só perde força pela repetição exaustiva do pronome de tratamento gay (Nova Gramática de ‘Bichara’), BI.

Dito inúmeros vezes pelo ator transformista, o cacoete incomoda e não faria falta, se saísse de cena juntamente com o falso moralismo da ala conservadora.

 

Crescemos ouvindo – no bueiro da rua e de casa – as blasfêmias que ator, atriz, que quem faz teatro é viado, bicha, sapatona, drogado, vagabundo, puta ou tudo isso junto.

E pensar que a educação se dá no berço do lar ou na calçada da rua…

 

O Filho da Atriz

 

“Rir todos os risos e chorar todos os prantos”.

 

A intensidade do ator e a efemeridade da vida em uma frase.

 

‘O Filho da Atriz’ evidencia a realização de um crime em detrimento à possibilidade de se viver uma outra vida que não era a sua (que de fato ela nunca conseguira viver).

‘Os filhos’ são os sonhos concretos ou aqueles mais abstratos que temos dentro do nosso ventre fértil e vil.

 

Segue o link para assistir o filme na íntegra pelo Vimeo:

http://vimeo.com/47867272

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