Crítica: A Menina que Roubava Livros
por Rodrigo Stucchi
O que um filme precisa ter para ser lembrado? Bela história, roteiro intrigante, grandes e sutis sacadas? Ou tudo se resume a dinheiro investido, produções magníficas e atores conhecidos? Em A Menina que Roubava Livros encontramos um pouco de tudo isso. Um pouco. É justamente esse “um pouco” que separa os ótimos dos inesquecíveis.
O roteiro é incrível. Fiel ao livro de mesmo nome, um best-seller do escritor australiano Markus Zusac, a história é focada na vida de Liesel Meminger (Sophie Nélisse), uma jovem filha de mãe comunista que sofreu com o regime alemão durante a Segunda Guerra Mundial. Dentre tantas obras que retratam o drama das famílias nas guerras, esta mostra a visão dos próprios alemães, como viviam, o que pensavam e como enfrentavam o nazismo. Nesta, o foco é mostrar como a protagonista (e os alemães) tentam preservar sua cultura em meio a imposição de Hitler de destruir livros e toda forma de arte.
O “roubo” de livros da protagonista começa durante o enterro de seu irmão, quando ela resgata do chão o “manual do coveiro”, deixado pelo próprio coveiro na neve. A jornada de Liesel é retratada a partir daí, pouco antes de sua mãe entregar-lhe à adoção para uma família da fictícia cidade de Molching. Na Rua Himmel, reside o casal de classe trabalhista formado por Hans e Rosa Hubermann, vividos pelos excelentes Geoffrey Rush e Emily Watson. É o pai adotivo da menina que lhe ensina a ler e propicia o hábito e a paixão pela leitura. Como se não bastasse, o livro é narrado pela morte, que acompanha a vida da garota entre os anos 1939 a 1943. Nada mais justo, afinal, quem melhor para narrar uma guerra que a morte?
Pontos fortes do filme: A atuação dos personagens principais é muito boa. Afinal, não é fácil ser sutil e leve em tempos de guerra. Atuar com essa naturalidade, menos ainda. Os figurinos, cenários, paisagens, também são de primeira qualidade. O roteiro ajuda demais e, quando explorado, detalhes como a invenção de palavras por parte de Liesel, a forma com que ela “roubava” os livros, seu jeito todo especial de ver o mundo e retratá-lo com poesia, são os pontos altos da película. O filme não apela para cenas de violência excessiva, mutilação, entre outras barbáries, mesmo nos momentos mais fortes.
Bom, quer dizer que temos uma bela história, com roteiro intrigante, grandes sacadas, atores consagrados, figurino, produção, dinheiro. Ou seja, temos um filme inesquecível? Não. Temos uma ótima produção, mas não inesquecível. Por algumas razões: Liesel não “rouba” no filme tanto quanto no livro. A participação de Max não é tão importante quanto deveria. No livro, a menina inventa palavras, mostra todo seu potencial poético ao retratar como vê as coisas. No filme, isso é pouco explorado. As tomadas não retratam o horror da guerra, mas mantém uma sutileza incômoda que não gera tensão. Por falar em pouca emoção, um fato: John Williams não é mais o mesmo. Apesar de sua 49ª indicação ao Oscar, a trilha está mais para Lincoln e Cavalo de Guerra, a ET, Indiana Jones, Star Wars e A Lista de Schindler, o que é uma pena! A narração da morte é imperceptível, infelizmente, só vindo à tona nas últimas cenas. Finalmente, assim como muitos filmes que têm a difícil missão (quase impossível – eu nunca vi) de transformar best-sellers em super produções Hollywoodianas, este também se perde ao focar mais no romance paralelo que efetivamente na complexidade de seus personagens. O que, não importa quantas vezes aconteça, é sempre frustrante.
É comum encontrar críticas que comparam películas aclamadas com novos não tão brilhantes. Note: quanto maior o potencial do novo filme, maior sua comparação com outros que marcaram época. Este não é diferente, dadas as inúmeras obras que retratam não só a Segunda Guerra Mundial, como outras. Enfim, vou evitar a comparação. O filme é ótimo (muito devido ao fato do livro ser excelente, é verdade) e vale muito a pena assistir! Sinceramente, assim como há vários filmes melhores, existem muito mais filmes bem piores. Este é um que recomendo com toda certeza. Quase dei 4 claquetes! Sem dúvida, prefiro filmes como este, com todos os seus erros, que muitos aclamados pela crítica, porém entediantes ou extremamente violentos. Veja e depois você me conta o que achou.