Crítica: RoboCop
José Padilha afirmou em diversas entrevistas que RoboCop é um filme brasileiro feito com 120 milhões de dólares. Afinal, ele levou seu montador, fotógrafo e compositor preferidos para trabalhar com ele. E se ao longo da projeção deste remake o filme não é exatamente tão brasileiro, o sarcasmo da cena final mostra que, no mínimo, o diretor não é um americano do tipo nacionalista.
Neste RoboCop, remake do filme cult de Paul Verhoeven de 1987, o debate que Padilha iniciou em seus filmes prévios permanece: a “robotização” do policial como forma de deixar a polícia mais fascista e, portanto, “mais eficiente” mesmo que desumana. Se no Brasil contemporâneo de Tropa de Elite os policiais se transformam em “caveira” para poder matar jovens maconheiros, no mundo futurístico de RoboCop os policiais robôs matam crianças só porque elas estão armadas com facas.
Padilha é eficiente em contar a trama de Alex Murphy (Joel Kinnaman), o policial que sofre um atentado e fica seriamente ferido, tornando-se alvo de um experimento político-científico que visa colocar um homem dentro de uma máquina para conquistar a opinião pública. O espectador consegue compreender perfeitamente as vontades do protagonista em desvendar seu próprio crime, assim como sua fragilidade diante do controle total que um botão de “desligar” possui sobre seu novo corpo. Se Alex Murphy é um personagem interessante, o mesmo pode-se dizer do CEO da OmniCorp, Raymond Sellars (Michael Keaton, excelente), e principalmente do Dr. Dennett Norton (Gary Oldman), que se mostra como um personagem muito mais interessado na valorização do ser humano, já que antes de receber sua tarefa de desenvolver o “homem de lata”, fazia próteses para levar felicidade a pacientes amputados.
Mesmo que seja interessante o debate sobre o quanto os sentimentos humanos são importantes para que se evite o autoritarismo do Estado (e o quanto eles se afastam do robótico em sua essência), e mesmo que este RoboCop seja um excelente filme de ação, há uma certa “bagunça” que poderia ser melhor explicada: afinal, o filme é sobre o fascismo da polícia “robotizada” ou sobre a força da mídia na opinião pública? Talvez ele seja sobre a relação do homem com seu próprio corpo e quem deve comandá-lo, mas talvez ele seja sobre o marketing de uma empresa que não se preocupa com nada além de seus lucros – tanto que ela só quer a revogação de uma lei para vender mais de seus robôs.
É claro que vivemos em um mundo complexo e a vontade de Padilha e do roteirista estreante Joshua Zetumer deve ser de colocar tudo de uma vez, mas o fato é que essa diversidade de focos acaba pulverizando um pouco o pensamento do espectador.
Embora não tenha o humor e a violência do filme original, assim como não tem o metálico da armadura do primeiro filme (para horror dos nerds desesperados por versões super fiéis), RoboCop apresenta algo que faz falta aos americanos: a visão de um “outsider” para que eles possam enxergar com mais clareza o próprio umbigo.