As miseráveis grandes angulares no discurso de Tom Hooper
Um dos principais defeitos do musical “Os Miseráveis”, de Tom Hooper, apontado pelos críticos de cinema, é também considerado um dos principais defeitos do diretor em “O Discurso do Rei”, seu trabalho anterior.
Este principal defeito se chama “grande angular” e “câmera inclinada”. O que os principais críticos clamam é que o diretor exagera nas cenas com estes dois recursos sem qualquer motivo para a narrativa.
Antes de tudo, é preciso compreender que uma cena deve ser meticulosamente pensada pelo diretor. A mise-en-scène (movimento dos atores na cena), os objetos, o cenário, as roupas, a posição da câmera e seu ângulo são apenas alguns dos exemplos. E tudo que o diretor escolhe (ou guia os outros profissionais, como figurinista e diretor de arte, a fazer) deve ter alguma função para expressar os sentimentos do personagem, a situação deste no mundo em que vive ou qualquer outro elemento importante para a narrativa. Vamos a exemplos:
-Em “A Primeira Noite de um Homem”, quando o diretor Mike Nichols escolhe filmar Dustin Hoffman mergulhando em uma piscina e permanecendo no canto inferior da tela, enquanto uma grande quantidade de água preenche o espaço da cena, ele queria mostrar que o personagem de Hoffman sente-se deslocado do mundo em que vive, completamente estranho a tudo que o cerca.
-Em “Tudo Pelo Poder”, o diretor George Clooney utiliza a primeira e a última cena do filme para fazer um paralelo na mudança de vida do personagem principal, que no início falava para ninguém ouvir e não tinha palavras para dizer, mas ao fim passa a ter o que dizer.
-Na famosa cena do chuveiro em Psicose, Hitchcock optou por uma câmera subjetiva, ou seja, como se fosse os “olhos” do assassino. O objetivo, neste caso, é causar suspense com a trilha sonora, chocar o espectador e, obviamente, não revelar o rosto do assassino.
Voltemos à obra recente de Tom Hooper. O diretor optou, em seus últimos filmes, por inserir uma grande quantidade de cenas em que a câmera se encontra em uma inclinação incômoda e, mais ainda, cenas com uma lente chamada de “grande angular”. Esta lente faz com que a imagem fique parecida com o que vemos quando olhamos através de uma lupa ou de uma bola de vidro: isso faz com que as laterais da imagem fiquem distorcidas e ainda diminui distância focal, o que faz com que tudo além do primeiro plano fique desfocado. Mas deixemos as questões técnicas aos que realmente entendem disso.
O fato é que as cenas que Tom Hooper realiza não parecem acrescentar em nada à narrativa. Embora o diretor quisesse mostrar os atores de perto, ao contrário do teatro – e isso foi dito na crítica do filme -, ele não permite ao espectador admirar o design de produção ou figurino, por exemplo. Poder-se-ia dizer que a lente grande angular do diretor tenta mostrar um mundo “tortuoso” e cheio de “distorção”, como era a França da época retratada, mas a produção já mostra isso com o cenário e os personagens, e então caímos na dicotomia entre “o que” se narra e “como” se narra, ou seja, quando algo é narrado de uma maneira, com os elementos de cena, o posicionamento de câmera com suas lentes e cores é o “como”, ou seja, deve acrescentar à narrativa, e não repetir. Como conseqüência da câmera de Hooper, o espectador assiste a muitas paredes e espaços vazios, que não parecem trazer realmente algo novo ao filme. A crítica que fica é que Tom Hooper parece utilizar estes posicionamentos e essa lente com o único propósito de “fingir” que sabe o que está fazendo.
No fim das contas, o importante ao espectador é entender o que o diretor faz com a câmera e, unindo o filme às suas críticas, aprender um pouco mais sobre cinema.