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Entrevista: curta “Sangue da Terra”

Confira uma entrevista sobre a produção do curta “Sangue da Terra”: inspiração e conhecimento sobre como produzir um curta-metragem!

*imagem meramente ilustrativa

 

Todos os anos, o CEUNSP – Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio (na cidade de Salto) desenvolve um projeto chamado  AECA – Agência Experimental de Comunicação e Artes. A intenção é incentivar a produção de audiovisual no curso de cinema da faculdade, já que ela preza pela experiência prática. É uma forma de estimular todos os alunos a produzirem curtas e ganharem experiência.

Hoje, nós apresentamos aqui no Cinem(ação) uma entrevista com a produtora executiva Rebeca Campos e o diretor e roteirista Dirlei Baccili Filho, do curta “Sangue da Terra”, que foi um dos projetos selecionados entre 70 apresentações realizadas para os professores e diretores da faculdade. A entrevista faz parte de uma parceria nossa com a produção do filme, após o acesso que tivemos ao roteiro do curta!

Segundo a produtora Rebeca Campos, a faculdade seleciona de 5 a 10 projetos para que os alunos possam realizar. “Apenas alunos  da faculdade participam”, explica ela.

Na trama, acompanhamos uma história de vingança em algum lugar do interior.

 

 

Confira a entrevista com a produtora executiva Rebeca Campos:

 

Com o roteiro pronto, quais foram os desafios que você imaginou que teria nas filmagens?

Em termos de produção, Sangue da Terra se trata de um roteiro bem complexo. Desde o dia em que o li pela primeira vez, eu sabia que seria um desafio, mas era exatamente o que eu queria. Dentro da universidade somos instruídos a pensar na simplicidade: “menos é mais” é quase um bordão para todos os produtores que trabalham com curta-metragem de baixo custo. “Duas personagens, uma locação”, e fomos lá  fazer o completo oposto, cientes de que cada detalhe seria um enorme obstáculo. Para começar, “o porco”. O roteiro possui uma cena extremamente importante para a construção de caráter e o desenvolvimento do protagonista, e o elemento fundamental é um porco grande e vivo, que seria carregado por aí. Sabemos que qualquer animal em set de filmagens requer extremo cuidado, nem preciso falar como seria com um bicho tão complicado como os porcos são. Em seguida temos o nosso segundo maior crime: crianças! Dois pequenos meninos em papéis indispensáveis. Não só é difícil encontrar atores mirins pela região, como a atenção dada a eles deve ser ao máximo. Entre outras coisas, porém não vamos incluir uma longa conversa sobre as armas que são disparadas, a caminhonete, a cena do enforcamento e as muitas locações que precisaríamos conseguir para produzir tudo isso. Já deu para ter uma noção da trabalheira que seria, né?

Esses desafios se confirmaram? Ou foram outros?

Sim, se confirmaram problemáticos. Contudo fomos surpreendidos por uma mudança  final no roteiro, que nos trouxe o detalhezinho peculiar de um pássaro morto. Com o orçamento nos limites e os dias da gravação chegando, mobilizamos a equipe atrás desse item, de forma que se aproxime do mais real possível. Transmitir a realidade e o sentimento puro para dentro do curta é uma grande responsabilidade.

Para que o público possa entender: do que se trata o curta? Qual a sinopse e o objetivo dele?

Sangue da Terra fala sobre Alfredo, um jovem matador que assassinou o pai de um garoto, José, mas o permitiu fugir. Trinta anos se passam e Alfredo agora é um agricultor, viúvo, que cuida sozinho de seu filho em uma vila no interior de São Paulo. Na tentativa de buscar redenção por seus pecados, ele se empenha para tirá-los da vida pobre e difícil da zona rural. Enquanto isso, José se tornou um pistoleiro e está à procura de Alfredo para vingar a morte do falecido pai. O curta-metragem busca apresentar o clássico gênero faroeste através da perspectiva brasileira. No estado de São Paulo, existem inúmeras vilas onde a vida rural, agrária e pobre se prolongam. O projeto discute o afastamento dessas vidas em condições precárias que sofrem com as injustiças frequentes. Procuramos virar os olhos do público em direção das vilas que inspiram o filme, estas terras sem leis, afetadas pelo atraso e a dificuldade de quebrar o ciclo da vida afastada, tal como a vingança nele retratada neste faroeste paulista.

 

Baseada nessa experiência, que aprendizado ou dica você tem para outras pessoas que vão produzir o próprio curta?

De fato, “menos é mais”. Esta é uma frase muito importante para levar para toda a vida. No entanto, fujam do padrão. Se arrisquem, por mais que pareça desafiador. Não se prendam no simples só porque parece mais fácil. A minha vontade de produzir “Sangue da Terra” vem também da vontade de sair do óbvio, tentar trazer uma forte crítica em um filme de gênero dentro do cenário brasileiro, sem deixar a realidade escapar por nossas mãos. Tragam suas ideologias para o cinema e se esforcem para fazer do seu curta um bom filme, pois mesmo com um baixo orçamento e pouco tempo, se você levar o máximo de sua dedicação para o seu trabalho, nenhum desafio irá te parar.

 

 

Confira a entrevista com o diretor e roteirista Dirlei Baccili Filho:

 

Como surgiu a ideia de contar a história de Sangue da Terra?

A história se repete constantemente, assim como seus erros. Esse filme faz analogia a essa ideia através do ato de vingança, demonstrando o ciclo ao qual muitos são presos. Mas o filme tem como seu tema principal uma relação complicada entre pai e filho. Eu senti que essa história poderia ser contada através de um faroeste, assim trazendo o gênero para o Brasil, no interior do estado de São Paulo.

 

 Quais foram as influências de grandes filmes que te inspiraram? Algum deles possui uma trama cíclica?

As maiores inspirações para a história vieram de Red Dead Redemption (game de 2010, da Rockstar Games) que também toca no tema da repetição da história, entretanto no game a ideia é voltada à críticas ao comportamenta, vida e política americana. Outra inspiração para a história é o filme Os Imperdoáveis (Clint Eastwood, 1992).

 

“Sangue da Terra” tem uma história bastante “clássica”. Mas ao mesmo tempo fala muito do Brasil atual. Como você vê o ódio e a vingança na nossa sociedade? Como quebrar esse ciclo?

Como um fã do faroeste americano, eu tive a intenção de trazer o faroeste clássico para a face brasileira. Vejo a vingança e o ódio utilizados no filme como uma analogia à ignorância, medo, desespero e raiva, demonstrado por muitos brasileiros nos momentos políticos, sociais e criminais da atualidade. A solução, eu acredito, é quebrar o ciclo, impedi-lo de continuar. Entretanto as respostas de como se chegar a essa solução não cabem a mim responder pelo país. Posso dizer apenas um ponto apresentado pelo filme: que devemos impedir os erros da história de se repetirem.

 

É difícil pensar e um personagem tridimensional? 

Um pouco, sim. A maior dificuldade é criar personalidades diferentes para as personagens, praticamente criar pessoas. Claro, há o estudo e a busca pela representação correta de pessoas reais através das personagens, todavia essa parte é feita através de pesquisa, tornando-a mais fácil que o ponto anterior.

 

O roteiro possui muitas montagens. Você acha que essas sequências de imagens ajudam a contar uma história em tempo mais curto?

A ideia das montagens é apresentar não apenas a passagem de tempo, mas também a vida “solitária” (devido à relação afastada entre pai e filho) e cansativa das personagens. Utilizei das montagens para demonstrar isso, pois conta o necessário sem cansar o telespectador.

 

Baseado nessa experiência, que aprendizado ou dica você tem para outras pessoas que vão produzir o próprio curta?

Ler o livro “O Cinema e a Produção”, de Chris Rodrigues, e sempre ficar atento às realidades da produção existente em seu filme e com seu orçamento. É de suma importância estar atento a todas as questões de produção e realizar tudo dentro do prazo e cronograma estabelecidos. Para o roteiro, a dica é ler importantes livros sobre roteiro (como “Da Criação ao Roteiro” de Doc Comparato, e “Manual do Roteiro” de Syd Field); ler e analisar roteiros de outras pessoas, incluindo roteiros de grandes filmes já conhecidos; e escrever cada vez mais, só assim a escrita e técnica melhoram, só assim é possível tornar-se um grande roteirista. Eu, como estudante, ainda estou nesse caminho e nele permanecerei por um tempo considerável, pois ainda tenho muito a aprender.

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