Crítica: La Traviata, Meus Irmãos e Eu - Cinem(ação)
Crítica: La Traviata, Meus Irmãos e Eu - 45ª Mostra de Cinema de São Paulo
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Crítica: La Traviata, Meus Irmãos e Eu – 45ª Mostra de Cinema de São Paulo

La Traviata, Meus Irmãos e Eu – Ficha técnica:
Direção: Yohan Manca
Roteiro: Yohan Manca
Nacionalidade e Lançamento: França, 2021 (45ª Mostra de São Paulo)
Sinopse: Nour é um garoto de 14 anos que aproveita o começo do verão no sul da França. É o mais novo entre quatro irmãos que moram juntos em um conjunto habitacional, e que se revezam nos cuidados com a mãe, que está em coma. Como ela gostava de ópera, Nour coloca música para ela ouvir e acaba se apaixonando por esse gênero musical.
Elenco: Maël Rouin-Berrandou, Judith Chemla, Dali Benssalah, Sofian Khammes.

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Não são poucos os filmes coming-of-age que se passam nas férias de verão. Também não são poucos os filmes que mostram um adolescente talentoso em um ambiente pouco propício ao seu desenvolvimento. “La Traviata, Meus Irmãos e Eu” é, portanto, um filme que não propõe grandes novidades, e mesmo assim consegue executar bem sua proposta.

No filme de Yohan Manca, exibido na competição de Novos Diretores da 45ª Mostra de Cinema de São Paulo, acompanhamos o adolescente Nour, que vive com os irmãos mais velhos enquanto a mãe segue em coma no mesmo apartamento. Apaixonado por ópera tal qual sua mãe, o menino encontra uma oportunidade de estudar música e cantar.

Sem qualquer julgamento dos irmãos de Nour, que fazem o que podem para pagar as contas e seguir adiante, a narrativa do diretor nos permite entender os desejos do protagonista com a mesma reticência com que o garoto a exprime. Mesmo que não goste de jogar futebol como seus irmãos, ele demora a mostrar seu total apreço à música, culminando na cena em que ele canta do corredor para não ser visto, ainda na primeira parte do filme.

Uma citação da dança como algo equiparável ao futebol e um colega que caçoa do protagonista ao vê-lo na aula de canto são algumas referências de “La Traviata, Meus Irmãos e Eu” ao já clássico Billy Elliot, mas as comparações param por aí, já que a resistência dos irmãos de Nour às aulas de canto estão muito mais relacionadas à condição social da família do que a preconceitos relacionados a sua masculinidade.

Aliás, as definições de masculinidade formam um tema importante de “La Traviata, Meus Irmãos e Eu”. Mesmo que de forma ríspida ou desajeitada, todos eles demonstram carinho e cuidado em relação à mãe – e também uns aos outros. O destaque vai para a atuação poderosa e convincente de Dali Benssalah, que faz um irmão mais velho cheio de nuances, com o peso da responsabilidade no olhar.

Com o humor como aliado, o filme ainda aproveita os momentos mais pesados do ponto de vista narrativo para dar mais leveza, como na situação do “roubo” da mãe do hospital – que pode ser absurda, mas condiz com a forma de vida dos irmãos. Outra situação que se torna mais leve por escolhas do roteiro, mas que faz sentido, é o encontro da professora Sarah com a mãe acamada de Nour: por mais emotivo que possa ser, ele também evita transformar a situação em um choque para ela, já que seu trabalho como professora na escola pública provavelmente a colocou anteriormente em confronto com a dura realidade das pessoas do bairro. E o resultado final da briga com os policiais é rapidamente deixado de lado, sempre com ares de comédia circundando os momentos.

Sem ser piegas ou otimista em relação a todos os personagens, o coming-of-age francês consegue ser muito eficiente com o que não é dito. Seja na relação conflituosa com o tio, seja no carinho dos irmãos com a mãe – e os peixes, e a comunidade do bairro –, o filme não tem muito a ser dito, já que seria muito mais surreal e inverossímil que “marmanjos” como eles comentassem seus sentimentos. Até mesmo as reações entre Sarah e Nour se enriquecem diante de olhares e percepções individuais, silenciosas.

Quando o menino sorri ao cantar, quando a professora insiste para que ele permaneça nas aulas, quando Nour finge (sem sucesso) estar desinteressado pelas novas descobertas, e até nos minutos finais que envolvem um convite, há sentimentos não externalizados: situações comuns e até esperadas, já que ninguém vive uma sessão de terapia constante.

É por isso que a narração em off do protagonista, tanto a do início quanto a dos momentos finais, contribui para o enfraquecimento de “La Traviata, Meus Irmãos e Eu”.

No momento em que o protagonista dá um abraço no irmão, nada é dito. E não é preciso. Porque o bom filme, assim como a boa música, fica melhor quando se sabe o momento certo de usar o silêncio.

  • Nota
4

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