O mercado audiovisual pós Covid-19 custará caro para o Brasil
Simplificando Cinema

O mercado audiovisual pós Covid-19 custará caro para o Brasil

A principal preocupação do público que frequenta as salas de cinema é saber quando elas irão reabrir. Pesquisas feitas no Brasil mostram que a população brasileira realmente sente falta de ir ao cinema.

No entanto, enquanto os espectadores e criadores de conteúdo voltam sua atenção para esta questão, outro elo da cadeia passa despercebido. Você já imaginou quanto irá custar uma produção daqui para frente?

Os modelos de orçamentos e planos de investimento que conhecíamos irão ficar no passado, novos gastos precisam ser inclusos na planilha e isso irá gerar um alto custo para o cinema mais independente, principalmente em países que dependem 80% do auxílio estatal para realizarem seus filmes.

É cedo para definir qualquer coisa, mas países que retomam a atividade cinematográfica já nos mostram como será a realidade pelos próximos três anos: filmes com poucas locações, equipes reduzidas, confinamento e EPIs.

Um orçamento de R$ 15 milhões já é considerado algo grandioso para o país, filmes brasileiros que são recorde de bilheteria, geralmente tem seu plano orçamentário definido nesta cifra.

Quando orçamos um filme, muito além de contar com as necessidades básicas de produção e equipe, temos que pensar na alimentação e no seguro de vida destes funcionários que estarão no set e na base de nossas produções.

Atualmente, o seguro de vida disponível para o entretenimento não vem com diretrizes que garantem proteção ao Covid-19. Afinal, até o fim do ano passado, ninguém esperava que fosse realmente precisar de algo assim.

Além de ter que rever os orçamentos possíveis dentro do seguro de vida, produtoras precisam estar atentas ao que diz a Lei Previdenciária, já que a mesma não define doença endêmica como um acidente de trabalho, logo, quem pagará as despesas do funcionário afastado por Covid-19?

Caso o contágio ocorra durante as filmagens, a situação sai ainda mais cara para quem precisa fazer a gestão deste dinheiro. É preciso pensar em um cronograma de trabalho muito maior do que o período entre a produção e desprodução, correndo aqui sérios riscos de perder dinheiro.

Já é de praxe, no mercado de produção, prever dias e meses mais adequados para gravações externas: alterações no clima podem atrasar produções, e no audiovisual tempo realmente é dinheiro. E agora, o que fazer quando a preocupação também atinge cenários internos?

Uma das propostas que vem sendo dadas aos produtores é fazer uma longa pesquisa de locações que sejam afastadas dos centros urbanos e possam confinar uma equipe inteira durante todo o processo de produção da obra audiovisual.

A solução pode ser simples, mas quem realmente conseguirá arcar com estes custos? Dentro deste cenário, é preciso pensar em como deslocar toda a equipe para este local, e isso envolve pagar os custos de viagens e acomodações. Um longa metragem pode ter até 300 pessoas envolvidas nesta fase.

É preciso que o produtor audiovisual brasileiro enxergue esse momento com clareza. Equipes serão reduzidas, e o que antes se fazia com o apoio de dois, três ou até mesmo quatro assistentes em cada setor chave, será reduzido a um ou trocado por um estagiário por questões orçamentárias.

A redução dos custos com a equipe também reduz os custos com os materiais de proteção e limpeza. Higienizar o ambiente ao menos três vezes ao dia e oferecer equipamentos individuais para a equipe pode fazer o produtor mais novato estourar os limites de captação de recursos.

Deixo aqui uma reflexão: como o cinema nacional mais independente poderá sobreviver tendo que arcar com estes custos extras? A resposta que encontro para esta pergunta é, infelizmente, a produção sendo realizada sem muito suporte, ou simplesmente sumindo das nossas telas por um tempo considerável.

A culpa disso não é apenas do Covid-19. É também de um governo que não vem ligando para auxiliar estes profissionais e uma agência que já declarou preferência em coproduções internacionais que não interferem tanto nas contas de retorno ao FSA.

O mercado, que já era bastante competitivo no Brasil, pode se fechar ainda mais na valorização de novos talentos, fechando o círculo de produção em profissionais que já demonstram certa confiança para estas produtoras.

No entanto, a produção de novos conteúdos continua a ser pensada. Temos produtores que ainda querem arriscar a sair da bolha dos gêneros mais acessados pelo público brasileiro e transformar o cenário da próxima década.

Com ou sem Covid-19, o cinema brasileiro continua sendo uma forte arma de resistência nacional. Acharemos a saída cedo ou tarde.

Deixe seu comentário