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Crítica: Um Limite Entre Nós

Um Limite Entre Nós é claramente uma peça de teatro… e como tal, depende das atuações.

 

Um Limite Entre NósFicha técnica:
Direção: Denzel Washington
Roteiro: August Wilson
Elenco: Denzel Washington, Viola Davis, Stephen Henderson, Jovan Adepo, Russell Hornsby, Saniyya Sidney e Mykelti Williamson.
Nacionalidade e lançamento: EUA, 2016 (2 de março de 2017 no Brasil)

Sinopse: Troy Maxson trabalha em uma empresa de coleta de lixo nos anos 1950. O pai de família, que já sonhou em ser um jogador de baseball profissional mas sofreu com as consequências de um período racista, ficou amargurado. Ele cria tensão na família ao acabar com os sonhos do filho de se tornar um jogador profissional.

 

Uma coisa é fato: “Um Limite Entre Nós” possui atuações primorosas.  Considerando que é praticamente um teatro filmado, e o teatro é a grande “arte do ator”, o filme não poderia seguir por outro caminho.

Assim, diferente de mitos outros filmes, este é essencialmente verborrágico. A ideia de “show, don’t tell” (mostre, não conte) não funciona aqui. Afinal, as informações sobre os personagens chegam através dos diálogos. Alguém poderia criticar esse tipo de adaptação, mas considerando que na história do cinema surgiram grandes filmes como “Uma Rua Chamada Pecado” e “Quem tem medo de Virginia Woolf”, há de se valorizar esse tipo de empreitada.

Na trama, acompanhamos a difícil vida do casal Troy (Wahsington) e Rose (Davis), que vivem com o filho Cory (Adepo). Logo nos primeiros instantes de “Um Limite Entre Nós”, uma desconfiança do amigo de Troy determina o fio condutor da maior parte dos problemas. Mas grande parte das discussões vêm de questões do passado da família humilde, que não tardam em surgir conforme os diálogos vão se desenvolvendo.

Um Limite Entre Nós

Centrado em Troy, o filme o mantém sempre no controle. Aos poucos, vamos entendendo o que o faz ser tão duro com todos ao seu redor – e ceder somente em alguns momentos graças à sua esposa. Não que o personagem seja digno de grande admiração: ele ainda é um homem cheio de defeitos. Pelo menos sua trajetória faz sentido e culmina em reflexões sobre a vida, a família e os relacionamentos.

As nuances sociopolíticas estão presentes no texto, que é adaptado ao cinema pelo próprio August Wilson, autor da peça – lançada em 1983 e encenada pelos próprios Denzel Washington e Viola Davis em 2010. Obviamente, as situações de todos os personagens jamais seriam as mesmas se a cor da pele deles fosse diferente, e a todo instante se traz à tona um elemento que discute a discriminação racial no período.

Um Limite Entre Nós

 

As “cercas” do título original da obra – e que são os “limites” do título brasileiro – formam uma interessante metáfora para a relação conflituosa da família. Ele tenta construir essa ligação com o filho (literal e sentimentalmente) mas sua maneira dura de lidar com a vida o impede de dizer que ele simplesmente “gosta” do filho – e quando ele diz “eu te amo” ao amigo de longa data, surge o questionamento inevitável de por que é tão difícil dizer isso aos familiares.

Com uma câmera que parece não saber onde ficar durante as cenas repletas de diállogos, embora haja um enquadramento aqui e outro ali que parece dar espaço para os personagens terem alguma privacidade, Denzel Washington permite que os holofotes caiam nas atuações – que estão excelentes, sem exceção. E se o próprio diretor e protagonista merece a indicação que teve a melhor ator, é Viola Davis quem se destaca, de fato. A atriz será lembrada pelo momento em que declara um monólogo sobre sua posição de mulher relegada ao posto de dona de casa, chorando de maneira que poucos conseguem fazer; mas é nos minutos finais que ela mostra toda sua capacidade de falar com doçura, dar um tapa no filho e rir dos momentos rememorados.

 

No fim das contas, “Um Limite Entre Nós” é o retrato de um homem amargurado, ressentido e cheio de culpas que, entre tantos erros e acertos, tentou seu melhor e foi fruto de um mundo duro e cheio de injustiças. “Às vezes o toque dele machucava, às vezes quando ele me abraçava, me cortava”, resume Rose em um de seus muitos momentos inspiradores. A mesma personagem diz para seu filho: “seu pai queria que você fosse tudo o que ele não era. Ao mesmo tempo, queria que você fosse tudo o que ele era”. É nesse paradoxo de felicidade misturada com o peso insuportável de uma história sofrida que se encontra o filme – e a peça.

“Um Limite Entre Nós” está longe de ser uma das melhores adaptações do teatro para o cinema, mas cumpre com seu papel de representar uma importante obra teatral americana, e permite que os atores atinjam ápices de interpretação.

  • Nota
3.5

Resumo

“Um Limite Entre Nós” está longe de ser uma das melhores adaptações do teatro para o cinema, mas cumpre com seu papel de representar uma importante obra teatral americana, e permite que os atores atinjam ápices de interpretação.

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