Opinião política: sobre Aquarius e o Oscar
"Aquarius", com Sônia Braga, de Kleber Mendonça Filho
Cinema e algo mais

Sobre Aquarius e o Oscar

Apenas algumas palavras sobre Aquarius e o Oscar

Há algum tempo, escrevi um texto (bastante polêmico, na época), dizendo que o Brasil não sabe escolher filmes para concorrer ao Oscar. É uma pena que o que antes parecia apenas ignorância, hoje é uma burrice norteada por preferências políticas.

Após grande campanha para que Aquarius, novo filme de Kleber Mendonça Filho, fosse o representante do Brasil no Oscar, o MinC optou por levar o longa “Pequeno Segredo”, de David Schurmann.

 

O que nos leva a duas questões:

1- Sem discutir a qualidade das produções (até porque não assisti a nenhuma delas), o fato é que não levar um filme aplaudido em Cannes é de uma burrice gigantesca. Com a repercussão internacional do longa, haveria chances de alguma indicação. O longa de Schurmann, por mais que tenha falas em inglês e atores americanos, não teve qualquer repercussão. O que nos leva ao segundo ponto.

2- O longa estrelado por Maria Flor e Julia Lemmertz precisaria ser lançado entre 1º de Outubro de 2015 e 30 de setembro de 2016 para se enquadrar nas regras da Academia de Hollywood. Assim que anunciado pelo MinC, o longa teve seu lançamento adiado de 10 de novembro para 22 de setembro. Muito estranho, especialmente se considerarmos que o atual governo é chamado de golpista pelos quatro cantos do país. Aposto que ele não ia querer criar nenhuma desconfiança a mais das pessoas, não é mesmo?

 

Aquarius

 

Não me resta nada além de acreditar que, de fato, o longa pernambucano foi boicotado e perseguido, simplesmente porque a equipe se manifestou em Cannes contra o então presidente em exercício (hoje presidente, sem exercício mesmo) utilizando expressões “Fora Temer”, hoje repetidas ad nauseam por tanta gente. Qualquer tentativa de argumentar o contrário será bem-vinda nos comentários.

Eu poderia utilizar este espaço para recordar que a última vez em que produções artísticas foram perseguidas pelo governo, vivíamos sob uma ditadura militar. Também poderia lembrar que o governo deposto nunca perseguiu nenhum artista ou cidadão notável que se manifestasse contrário a ele – e eram muitos, como nossa memória de curto prazo permite recordar -, muito menos interferindo em decisões fora da alçada política.

Mas ater-me-ei (uso mesóclises em homenagem ao senhor presidento) apenas à burrice de não aprovar Aquarius para competir por uma indicação ao Oscar. Tratar-se-ia da melhor opção, sem qualquer dúvida, apenas pela repercussão internacional e pelo histórico de Sônia Braga, ícone brasileiro no exterior que esteve em filmes como “O Beijo da Mulher Aranha”, indicado a quatro Oscars três décadas atrás.

 

O cinema brasileiro pode perder mais uma chance de brilhar, mesmo que minimamente, em águas internacionais. Será uma vergonha apagar as luzes do nosso cinema. Mais vergonha ainda é ter governantes que não conseguem conviver com o barulho da democracia.

 

ATUALIZAÇÃO (19/09/2016): Confesso que me precipitei ao criticar com tamanha veemência a “perseguição”. Cada vez mais surgem versões diferentes da história, e isso deve ser levado em consideração. Um artigo da Folha e outro do Estadão ajudam a compreender melhor a situação (ou se confundir ainda mais). Ainda assim, é muito estranho que o filme Pequeno Segredo tenha repentinamente mudado sua data de estreia.

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