O que é um MacGuffin e por que é chamado assim? - Cinem(ação)
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O que é um MacGuffin e por que é chamado assim?

Na última cena do clássico de 1941, Relíquia Macabra, Sam Spade (interpretado por Humphrey Bogart) entrega uma assassina (interpretada por Mary Astor) e uma estátua de falcão preto às autoridades. Quando perguntaram o que exatamente era aquela estátua, o detetive encara o horizonte e explica de uma maneira nada satisfatória: “Isso é do que os sonhos são feitos.”

O que é um MacGuffin?

Essa estátua de falcão preto – a chamada Relíquia Macabra – é o exemplo perfeito do que os críticos e conhecedores de cinema chamam de “Macguffin” (ou “McGuffin“): uma importante estratégia narrativa, ironicamente mal nomeada, que aparece em muitos filmes. Em resumo para os que não estão familiarizados, MacGuffin é um objeto, evento ou pessoa que tem grande importância para os personagens (principalmente protagonistas). Tanta, que geralmente todo o enredo se vira em torno disso, apesar do objeto (evento ou pessoa) em si não ser lá essas coisas para a narrativa que se desenrola.

No fim das contas, não importa muito o que essa coisa – o MacGuffin – é. O importante é a motivação que ele proporciona para os personagens levar a história para frente. O diretor Alfred Hitckcock falou sobre essa ferramenta em uma entrevista de 1967:

“O que aprendi é que o MacGuffin não é nada. Estou convencido disso, mas acho muito difícil de provar para os outros. Meu melhor MacGuffin, no sentido de “mais vazio”, o menos existente e o mais absurdo, foi o que usei no ‘Intriga Internacional’. O filme é sobre espionagem, e a única questão que existe na tela é “o que os espiões estão procurando?” Bem, durante a cena de luta no aeroporto de Chicago, o profissional da inteligência Central explica toda a situação pra Cary Grant, e este, se referindo ao personagem de James Mason pergunta: “O que ele faz?” O homem da contrainteligência responde: “Vamos apenas dizer que ele é um importador e exportador.” “Mas o que ele vende?” “Ah! Só segredos do governo” é a resposta final.  Aqui você vê o MacGuffin sendo reduzido a sua mais pura essência: nadica de nada!”

(Devemos perceber que enquanto Hitchcock e, em tempo mais modernos, profissionais como J.J. Abrams, usam esse tipo de abordagem para o MacGuffin, do tipo “não importa o que é e o que faz”, na maioria de seus trabalhos, outros diretores (como George Lucas) vão em outra direção e definem o MacGuffin como algo que “a audiência deve se importar… quase tanto quanto se importam com heróis e vilões lutando na tela”).

Enquanto o termo “MacGuffin” é relativamente novo (daqui a pouco chegamos lá), o seu conceito já aparece nas primeiras obras-primas do mundo escrito. No poema Ilíada de Homero, que foi composto a três mil anos atrás, o MacGuffin foi Helena de Troia e sua incomparável beleza. Mas perceba, poderia ser a “Helena de Troia e sua majestosa batata doce assada” que causou o lançamento de centenas de navios para a guerra, contando que a narrativa deixasse claro o porquê dos personagens estarem tão empenhados em conseguir essa tal batata. Poderia ser a curiosidade de saber que tipo de comida era essa e de onde veio. Ou talvez o autor poderia deixar sua importância mais explicita, declarando que aquela receita de batata assada foi dada a Helena pelos deuses e quem a comesse se tornaria imortal.

Mas e esse nome?

Hitchcock (olha ele outra vez) é frequentemente creditado como autor do termo, apesar de ele mesmo nunca ter declarado isso. Todavia, em uma ocasião ele disse que talvez venha de uma velha e humorosa história:

“Tem um cara num trem. Ele vê um pacote e pergunta o que era aquilo. Um homem diz que é um MacGuffin. O cara pergunta, o que é um MacGuffin? Um camarada diz que um MacGuffin é um aparato para prender leões nas [montanhas] Adirondacks. “Mas não existem leões nas Adirondacks!”, outro parceiro reclama. ‘Então isso não é um MacGuffin,’ o segundo cara diz.”

Esta é uma variante de uma história similar com a mesma mensagem, com a moral sendo aquela velha piada “Não me faça nenhuma pergunta e eu não te direi mentiras!”:

“”Com licença, senhor. Mas você poderia me dizer o que tem neste extraordinário pacote?”
“Certamente! Um suricato.” Respondeu o senhor.
“Ah! Claro!” Exclamou o passageiro, com uma certa curiosidade. “Mas o que é um suricato, Senhor?”
“Algo usado para se matar cobras”
“Mas por que você quer matar cobras com um suricato?” perguntou o jovem homem.
“Meu irmão sonha com alucinações e vê cobras o tempo inteiro, então eu vou acabar com isso”
“Mas, com todo o respeito, senhor, as cobras das alucinações do seu irmão não são reais, mas produtos de sua fértil imaginação. Não são cobras reais, senhor!”
“Bem, isso também não é um suricato real””

No âmbito de quem realmente inventou o termo MacGuffin, o escritor MacPhail geralmente leva o crédito. Por exemplo, o cineasta Ivor Montagu trabalhou com Hitchcock e MacPhail perto de quando o termo começou a aparecer e declarou que “foi Angus [MacPhail] que começou a usar MacGuffin para um objeto de roteiro ainda desconhecido, mas que você não precisa definir até o fim do planejamento da história.” Ele diz também que era um termo que Hitchcock convenientemente usou até o fim de sua carreira.

MacPhail era um escritor de estúdio, o que significava que ele era contratado para “consertar” roteiros e, na maioria das vezes, não recebia o crédito devido pela tarefa. Entretanto, Hitchcock confiava muito em Angus e sempre contratava escritor para as suas peças. Se MacPhail realmente inventou o termo, é dificil atualmente saber de onde ele tirou essa palavra. Algumas fontes dizem que o próprio Angus dizia ter pego emprestado da história do suricato acima, mas sem fontes primárias para confirmar esta afirmação
Existem especulações de que o termo faça referência ao termo ‘guff’, o que significa algo próximo de “sem noção”. Pode também já foi usado para se referir a uma pessoa “burra” ou “desastrada”. Então, talvez, MacPhail só pegou a primeira parte do sobrenome dele e adicionou o termo ‘guff’, criando uma nova palavra para uma história “sem noção” ou para apenas um elemento estúpido da narrativa.

Seja qual for o caso, foi Hitchcock quem popularizou o termo MacGuffin, graças ao frequente uso que ele fez, tanto do termo quanto da técnica narrativa que ele nomeia.

Traduzido e adaptado do artigo em inglês do Today I Found Out

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