Crítica: Power Rangers (2017) e a nova roupagem dos "super sentai"
Power Rangers (2017)
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Crítica: Power Rangers (2017)

Power Rangers (2017) é um filme surpreendentemente mediano. E sim, isso é uma boa notícia.

 

Ficha técnica:

Direção: Dean Israelite
Roteiro: John Gatins
Elenco: Naomi Scott, Dacre Montgomery, RJ Cyler, Ludi Lin, Becky G., Elizabeth Banks, Bryan Cranston, Bill Hader
Nacionalidade e lançamento: EUA, 24 de março de 2017 (23 de março de 2017 no Brasil)

 

Em tempos de cinema blockbuster baseado na nostalgia dos espectadores, torna-se quase impossível analisar um filme sem pensar nos fatores extrafilme que nos levam a uma nova franquia (ou tentativa de). Portanto, assim como nos questionamos sobre a importância política de longas que se propõe a serem um produto de seu tempo, devemos considerar que tipo de material prévio forma o produto que vemos. E foi assim com A Bela e a Fera, Star Wars: O Despertar da Força, entre tantos outros.

 

E por isso, sabendo do que se trata a (interminável) série de TV Power Rangers, bem como o (pavoroso) “Power Rangers: O Filme”, de 1995, é curioso notar que o novo filme seja diferente a ponto de acrescentar novos elementos à franquia, e com um pouco do tom original da obra. Não que isso signifique um resultado perfeito, mas ao menos algo que consegue divertir os espectador que busca entretenimento.

Com citações claras a “Clube dos Cinco” e “Conta Comigo”, o longa consegue  unir uma história de origem de super-heróis, um drama adolescente e uma aventura com robôs lutando ao estilo tokusatsu/super sentai.

E aqui, cabe citar os paradoxos no qual “Power Rangers” se enfia. Ao mesmo tempo em que une harmoniosamente os diversos tons e fontes do qual o filme bebe (diferente de Quarteto Fantástico, se tiver que fazer uma comparação), sendo dramático quando precisa e “galhofa” quando deseja, o fato é que nenhum destes objetivos é conquistado por completo, já que há excesso de piadas, dramas fracamente explorados e um tempo longo dedicado ao drama e às origens dos personagens. Outro paradoxo está na forma como “Power Rangers” encara o espectador: ao mesmo tempo em que trata a si mesmo como uma aventura adolescente feita para o mesmo público (na busca de formar uma nova audiência), opta por momentos mais “assustadores” (ou pelo menos impactantes), como a reaparição da vilã em um barco, que podem até encarar a maturidade das crianças de hoje em dia, mas já levam o filme para uma aparente confusão sobre qual o seu verdadeiro público-alvo.

 

O diretor Dean Israelite faz escolhas maduras com sua câmera: mostra um acidente de carro filmado de dentro, demonstrando estar mais preocupado com a imagem que outro diretor teria em um projeto deste em mãos. E ao contrário do que Bill Condon fez em diversos momentos de “A Bela e a Fera” (já que é para fazer paralelos), pelo menos Israelite sabe o momento de afastar a câmera para dar um panorama geral, utiliza bons posicionamentos e, com exceção da “batalha final”, onde deixa o espectador confuso em alguns momentos, nunca cria uma sensação de absoluto caos – diferente de certos diretores de filmes com robôs.

 

No quesito direção de atores, o filme é sofrível. Não que um filme dos Power Rangers precise ter Meryl Streep como Ranger Rosa contracenando com Clint Eastwood em uma armadura vermelha dialogando um texto escrito por Charlie Kaufman. Mas é claro que o filme não nos passa nada muito além do que um típico filme adolescente pouco preocupado em dramaturgia – e a semelhança do “ranger vermelho” Dacre Montgomery com Zac Efron certamente remete à qualidade dramatúrgica duvidosa de High School Musical. Apesar de Naomi Scott (a Ranger Rosa) e RJ Cyler conseguirem um mínimo de resultado positivo em superação pessoal e momentos de humor, respectivamente,  os outros atores jovens não fazem nada verdadeiramente impactante. O mesmo não se pode dizer dos veteranos, que parecem se divertir: Bryan Cranston funciona como Zordon e Elizabeth Banks se diverte absurdamente enquanto faz uma vilã unidimensional brega que é uma típica…  vilã dos Power Rangers!

 

 

Não que o roteiro ajude muito – embora seja louvável a ideia de ter desajustados desobedientes no lugar de alunos “certinhos”. No quesito “macro”, trata-se de uma típica “jornada do herói” (ou dos heróis, no caso), com a receita básica ensinada por McKee e nada que fuja do padrão. Mas nas jornadas individuais, temos uma série de clichês misturados a pequenas pinceladas de aprofundamento – o que é melhor que nada, mas ainda assim faz muito pouco. Entre os principais problemas estão a falta de arco dramático para Zack, o Ranger Preto, e o efeito nulo de um problema supostamente grave que desaparece magicamente em Billy, o Ranger Azul. Mas se isso tudo parece minimamente aceitável em um filme dos Power Rangers, é péssimo que os diálogos em batalhas pareçam ter saído de desenhos dos anos 90, com frases extremamente redundantes (“eles estão destruindo a cidade”, afirma a ranger, como se fôssemos cegos em um filme com audiodescrição). O mesmo pode-se dizer das piadas: é claro que algumas funcionam bem e arrancam risos, mas são tantas piadas a todo instante que até mesmo os produtores da Marvel achariam demasiado.

 

Exigências cinéfilas à parte, o fato é que “Power Rangers” diverte. É claro que diverte muito mais os fãs, já que no quesito “fan-service” (e apenas neste quesito, que fique claro), o filme chega a quase superar “Star Wars: O Despertar da Força”. Mas por trazer uma nova roupagem aos Rangers, fazer referências a outros filmes e mostrar que é possível atualizar uma franquia com características dos anos 90 que jamais funcionaria 25 anos depois naquele estilo, merece que olhemos para ele com mais carinho e menos rabugem.

 

E se tantos nerds tiveram o prazer em vibrar com a aparição da Millenium Falcon em “O Despertar da Força”, os fãs dos “super sentais americanos” têm o mesmo direito de receber com brilho nos olhos uma cena que é igualmente brega, infantil e nostálgica: os robôs correndo em um campo ao som de “Go Go Power Rangers”. E se tantas pessoas se tornaram fãs dos protetores de Alameda dos Anjos assistindo aos episódios macarrônicos na Globo… nada mais justo que um reboot da franquia em forma de “filme sessão da tarde” – com todas as dores e dissabores que o termo traz consigo.

  • Nota
2.8

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