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Crítica: Festa da Salsicha

Em Festa da Salsicha, Seth Rogen e companhia trazem seu humor juvenil de maconheiro ao mundo das animações

Ficha técnica:

Direção: Greg Tiernan, Conrad Vernon
Roteiro: Seth Rogen, Evan Goldberg, Kyle Hunter, Ariel Shaffir, Jonah Hill
Dubladores: Seth Rogen, Kristen Wiig, Michael Cera, Edward Norton, Jonah Hill, James Franco, Salma Hayek, Paul Rudd, Craig Robinson, Danny McBride
Nacionalidade e lançamento: EUA, 2016 (06 de outubro de 2016 no Brasil)

Sinopse: “Festa da Salsicha”, a primeira animação para adultos, conta a história de uma salsicha que lidera um grupo de produtos de supermercado em um jornada para descobrir a verdade sobre a sua existência e o que realmente acontece quando eles são escolhidos da prateleira.

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O humor de Seth Rogen e companhia é do tipo “ame ou odeie”. Dos grupos de “amigos da comédia” em Hollywood (que tem, por exemplo, os “amigos de Adam Sandler e os “amigos de Ben Stiller”), o grupo de Seth Rogen, composto quase sempre por James Franco, Jonah Hill, Craig Robinson, Michael Cera, Paul Rudd e Danny McBride (todos presentes em É o Fim) é aquele que sempre tenta ir mais longe na ousadia, ou simplesmente no choque: são piadas envolvendo genitálias, secreções, humor físico, minorias e, principalmente, maconha. E não seria de se espantar se fosse dito que a ideia inicial de Festa da Salsicha surgiu numa roda de fumo entre os amigos, em uma “sessão” com o bong.

Uma espécie de Toy Story deturpado, a animação é sobre um grupo de alimentos de supermercado que venera os humanos como deuses, acreditando que, quando são escolhidos por um de nós, são levados aos céus. Quando descobrem, no entanto, que a utilidade deles para nós é servirem como alimento (ou do ponto de vista deles: serem terrivelmente devorados), os alimentos terão que descobrir uma forma de escapar – e alertar a todos.

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Dirigida por  Conrad Vernon (Madagascar 3, Monstros vs. Alienígenas) e Greg Tiernan (o qual todos o trabalhos anteriores na direção foram ironicamente no desenho Thomas e Seus Amigos), a obra é escrita a cinco mãos pelo próprio Rogen, Evan Goldberg (que escreveu junto ao ator É o Fim, Superbad e a maioria das comédias recentes do grupo), Kyle Hunter, Ariel Shaffir e o ator Jonah Hill. Sendo assim, Festa da Salsicha possui todas as características da filmografia de Rogen e companhia, para o bem e para o mal. Se aqui estão presentes a ousadia, o nonsense e a sagacidade, estão presentes também a extrapolação, o descontrole, o humor juvenil. Os comediantes parecem tão fascinados com a liberdade que vem junto com o poder de realizar uma animação para os adultos, que a fizeram mais extrema do que muitos de seus projetos com atores reais. Mas como culpá-los?

Numa época onde o genérico é a regra, e temos animações sobre todo tipo de objeto e animal que ganha vida, qual a razão para não abraçar as provocações juvenis e politicamente incorretas de Festa da Salsicha, não é mesmo? E se há algo que o filme faz, é provocar. Rogen e seus amigos atiram para todos os lados: estereótipos raciais, religião, sexualidade… nem os “marombas” ficam de fora. O que vemos é uma chuva de palavrões (deve ter sido estabelecido algum novo tipo de recorde para o número de “fucks” ditos por minuto), obscenidades e a desconstrução da animação feita para a “família tradicional”.

Apesar de ser juvenil, a animação consegue ser inteligente em muitos aspectos, começando já pelo divertido e astuto design de personagens. Já começando por Brenda (dublada por Kristen Wiig no original) e sua clara alusão à genitália feminina. Além das inclusões óbvias das luvas em alguns de seus personagens – que remetem diretamente ao estúdio do Mickey Mouse – os alimentos possuem também sapatos, e ao observar com mais cuidado, percebemos que todos são diferentes uns dos outros (como seria, de fato, na vida real), de acordo com a personalidade e até “nacionalidade”. E sim, existem nacionalidades. Há piadas óbvias envolvendo maioneses alemãs que têm uma certa semelhança com um certo governo fascista, mas há também o humor na relação de ódio entre Lavash (uma figura do Oriente Médio dublada por David Krumholtz ) e Sammy (dublada por Edward Norton no original, é uma rosca judaica que é claramente uma paródia de Woody Allen).

Ainda na parte técnica, é notável, também, o esforço dos animadores por trás deste projeto. Com um orçamento de apenas 20 milhões (a maioria das animações é realizada com orçamentos que atingem a casa dos 100 milhões de dólares), as texturas individuais, qualidade e atenção aos detalhes são extremamente eficientes.Percebam também, a divertida brincadeira com as paletas de cores, retratando um mundo colorido e vivo através dos olhos dos alimentos, e acinzentado e sem graça no “mundo real.”

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No quesito dublagem, posso apenas dar a minha opinião em relação aos dubladores nacionais. É com desconfiança que assimilei o fato de que outro “grupinho de amigos” entrou na brincadeira, dessa vez um grupo nacional: o pessoal do Porta dos Fundos. O selo “Roteiro adaptado por Porta dos Fundos”, chamativo e evidenciado no pôster também não ajudava na questão da desconfiança… interferência em roteiros, dando uma “abrasileirada” na obra original costuma não funcionar (E todos sabemos o quão sofrível é a tradução dos nomes aos seus equivalentes tupiniquins, como “João” para “John”), mas, surpreendentemente, todas as piadas são boas e funcionam. O destaque é para o Barry de Gregório Duvivier. Felizmente Frank (que no original é dublado por Rogen), o protagonista, é dublado no Brasil pelo sempre eficaz Guilherme Briggs. O único estranhamento é com Twink, vivido por Porchat, com uma voz fina claramente forçada e desconfortável.

A dublagem, no caso, acaba sendo até eficiente, já que parte da “atração” do filme é justamente o vocabulário chulo utilizado pelos personagens. O impacto de ver figuras animadas falando palavrões na língua de sua audiência com certeza causa impacto, mesmo que elas percam força na já mencionada mania de exagerar de seus realizadores, soltando ofensas a todo instante até que tudo fique corriqueiro.

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Ao final, porém, é possível encontrar mais significado do que se esperava na animação. Por trás das piadas estúpidas – ainda que divertidas – das “piadas de maconheiro”, dos estereótipos raciais, o filme consegue tocar em assuntos complexos como a intolerância religiosa, mesmo que com a sutileza de um elefante rosa. Nesses estereótipos é onde Rogen e companhia extraem mais verdades, e as desconstroem com as provocações. Assim, Festa da Salsicha consegue ser juvenil e estúpido, mas também estupidamente inteligente em suas críticas, em seu “exploitation”. É um cinema de referências, paródias (desde O Resgate do Soldado Ryan à Exterminador do Futuro 2), de exageros, do abaixo aos bons costumes. E ao final da brincadeira do insulto, tudo que resta para Seth Rogen e companhia é a boa e velha orgia multisexual como um último tapa na cara da família tradicional brasileira  e seus bons costumes.

  • Nota Geral:
4

Resumo

Festa da Salsicha consegue ser juvenil e estúpido, mas também estupidamente inteligente em suas críticas, em seu “exploitation”. E ao final da brincadeira do insulto, tudo que resta para Seth Rogen e companhia é a boa e velha orgia multisexual como um último tapa na cara da família tradicional brasileira. mundial.

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